Pular para o conteúdo principal

A MAÍTA, O MEU ADEUS

                                                 Maíta - UFS - 1997
  

 

Jorge Carvalho do Nascimento

 

 

Em 1995 regressei do período em que permaneci na Universidade de Frankfurt, na Alemanha, depois de haver cumprido o meu Doutorado Sanduiche com bolsa CAPES. Morria de saudades da minha eterna orientadora, Mirian Jorge Warde, e dos colegas com os quais convivia na minha turma da PUC de São Paulo.

Na turma estavam dois jovens mestrandos, alunos da Universidade de São Paulo – a USP, orientandos da Profa. Dra. Marta Carvalho e adotados em disciplinas avulsas da Profa. Dra. Mirian Warde. Ambos eram encantadores pelo brilho da inteligência e pela leveza do convívio fraterno: Bruno Bontempi Junior e Maria Rita de Almeida Toledo – Maíta.

Assim que ingressei no Doutorado, no primeiro semestre de 1993, Mirian Warde me apresentou a ambos e nos encarregou de produzir um estudo que me foi extremamente importante: ler a obra completa de Fernando de Azevedo, analisar todas as suas notas de rodapé e, a partir delas, entender as influências intelectuais assumidas pelo consagrado autor de A CULTURA BRASILEIRA.

Era um trabalho que parecia insano. Coisa de louco. Mais uma das santas loucuras de Mirian Warde, entregue a três malucos, dois deles muito jovens (Bruno e Maíta). Levamos a sério e terminamos publicando um denso artigo que serviu de suporte a muitos trabalhos realizados por mim, por Bruno e por Maíta.

Nem só de ciência se vive. Dali nasceu uma longa e muito duradoura amizade. Trabalhávamos duas tardes por semana na residência de Maíta, no Campo Belo, sempre embalados pelos lanchinhos que a sua avó preparava. Amizade também fermentada pelos finais de tarde e pelas noites vividas no bar da rua Bartira, em frente ao portão lateral do Campus Monte Alegre da PUC.

Momentos nos quais se agregavam ao grupo figuras extraordinárias como os amigos Lúcia Franca Rocha, Fernando Casadei, Décio Gatti Junior, Marcos Cézar de Freitas, Olinda Evangelista e alguns outros. Casadei batizou o bar de “Nossa Caixa, Nosso Banco”, pela beleza e simpatia da garçonete que nos atendia e que também se transformou em amiga do grupo.

De ciência também se vive. Mirian determinou que eu fizesse matrícula como aluno especial numa disciplina oferecida na USP por Marta Maria Chagas de Carvalho. Ali conheci, frequentando a mesma sala de aula, alunos dos quais me tornei amigo: Luciano Mendes de Farias Filho, Diana Gonçalves Vidal, José Gonçalves Gondra, Moysés Khulmann Junior e mais alguns. Todos se tornaram importantes referências da pesquisa brasileira em História da Educação.

A Profa. Dra. Maria Rita de Almeida Toledo era agora Titular Livre Docente do Departamento de História da Universidade Federal de São Paulo – a UNIFESP. Deu importantíssimas contribuições à História da Educação no Brasil. Foi responsável pela construção do Centro de Memória da Universidade Federal de São Paulo. O seu trabalho como pesquisadora salvou o valioso acervo da Companhia Editora Nacional.

Maria Rita trabalhou como docente do Programa de Pós-Graduação em Educação: História, Política e Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – a PUC. Foi o mesmo Programa no qual ela defendeu a sua tese de Doutorado. Seus primeiros estudos foram voltados para os intelectuais da Educação, para os impressos e para as questões políticas e culturais das reformas pedagógicas.

Hoje recebi a muito desagradável notícia de que Maíta nos deixou aos 56 anos de idade, levada por um câncer de mama. Deixou Dodô, o amor da sua vida, e a sua filha, agora com 20 anos de idade. Fiquei desorientado desde que recebi a informação. Conversei demoradamente ao telefone com Bruno Bontempi. Li uma nota afetuosa escrita por Luciano Mendes.

Nunca sei o que dizer nessas ocasiões. Sinto que Maíta foi muito importante para todos nós. Estamos mais pobres sem a sua presença física, sem as suas ideias. A morte sempre me coloca diante de milhões de incertezas que chacoalham as minhas convicções acerca do mundo, a respeito da vida.

A Maíta só posso dizer ADEUS. Os meus contemporâneos insistem em partir. Quanto a mim, sinto que a morte insiste em roçar cada vez mais perto da minha canela.


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

TRIBUTO A LUCINDA PEIXOTO

      Jorge Carvalho do Nascimento*     Acabei de tomar conhecimento da morte da empresária Maria Lucinda de Almeida Peixoto, ocorrido hoje na cidade de Penedo, Estado de Alagoas. Lucinda era certamente a principal herdeira dos negócios da próspera família Peixoto Gonçalves, empresários que ao longo do século XX constituíram a mais importante e mais rica família da região do Baixo Rio São Francisco, consideradas as duas margens – a de Alagoas e a de Sergipe. Tive a oportunidade de conhecer Lucinda Peixoto no final do ano de 2009, quando iniciei uma pesquisa sobre os negócios da família Peixoto Gonçalves, a convite do seu genro, José Carlos Dalles, um dos principais executivos com responsabilidade sobre a gestão das atividades econômicas da família. Em maio de 2010, fiz uma série de entrevistas e mantive várias conversas com Dona Lucinda, como os penedenses e os seus amigos costumavam tratá-la. Fiquei impressionado com a sua memória que o tempo não conseguira embotar. Do m

A REVOLTA DE 13 DE JULHO, OS SEUS REFLEXOS SOCIAIS E OS MÚLTIPLOS OLHARES DA HISTÓRIA

      José Anderson Nascimento* Jorge Carvalho do Nascimento**                                                                                              Qualquer processo efetivamente vivido comporta distintas leituras pelos que se dispõem a analisar as evidências que se apresentam para explicá-lo. Quando tais processos são prescrutados pelos historiadores, a deusa Clio acolhe distintas versões, desde que construídas a partir de evidências que busquem demonstrar as conclusões às quais chega o observador. Historiadores como Roger Chartier e outros intelectuais filiados a diferentes gerações de estudiosos da chamada História Cultural foram sempre pródigos em demonstrar como todos os processos permitem não apenas que a eles se lancem diferentes olhares e, também que estes sejam permanentemente revistos. Neste texto, tomamos o conhecido episódio da revolta do Treze de Julho de 1924 para analisar como a revolta ocorrida em Sergipe sob o contexto brasileiro do Tenentismo comporta distinta

TRIBUTO A THAIS BEZERRA

      Jorge Carvalho do Nascimento*     Nasci no dia 28 de agosto. Passados 22 anos após o dia em que eu nasci, a mais importante colunista social de toda a história da mídia em Sergipe publicou a sua primeira coluna, GENTE JOVEM, no jornal GAZETA DE SERGIPE, a convite do nosso amigo comum Jorge Lins e sob a orientação do jornalista Ivan Valença, então editor daquele importante periódico impresso. Hoje estou aqui para homenagear a memória de Thais Bezerra. A partir do seu trabalho, dediquei alguns anos da minha vida à pesquisa e me debrucei a estudar o fenômeno da coluna social em Sergipe, inspirado pelo meu olhar curioso e pelas observações que sempre fiz a respeito do trabalho da jornalista inspiradora que ela foi.       O estudo, inicialmente dedicado ao trabalho de Thais Bezerra se ampliou, e no início do ano de 2023, resultou na publicação do livro MEMÓRIAS DO JORNALISMO E DA COLUNA SOCIAL, pela Editora Criação.   Thais Bezerra começou a trabalhar aos 17 anos de