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A AUSÊNCIA DE YARA


 

 

Jorge Carvalho do Nascimento

 

 

Ouvindo o noticiário da TV Sergipe na manhã desta segunda-feira, seis de outubro de 2025, tomei conhecimento da morte da jornalista Yara Belchior. Amiga muito querida, Yara passou a infância e a adolescência na zona norte de Aracaju, entre os bairros Dezoito do Forte e Santo Antônio. Fomos vizinhos.

Aportou por aqui ainda criança, por volta dos oito anos de idade, acompanhando os pais José de Sá e Gedalva que migraram de Salvador para Aracaju, seguindo os passos dos demais núcleos da sua grande família que tem origens no sertão do Estado de Sergipe, mais precisamente na região de Porto da Folha.

À medida que os anos passaram, a menina sapeca Yara se transformou numa adolescente viçosa, numa moça muito bonita, numa mulher exuberante., estudiosa, inteligente, numa militante política comprometida que sabia liderar. Encarnou compromissos sociais, tomou posição ideológica e se fez quadro do movimento estudantil quando ingressou na Universidade Federal de Sergipe, na segunda metade da década de 70. Ficou por lá até o início dos anos 80 do século XX, integrando o Partido Comunista do Brasil – PC do B, então na clandestinidade.

Tenho forte nas minhas lembranças a influência que Yara exercia sobre os seus irmãos mais novos (a belíssima Yracema e o inquieto Manoelzinho, ambos já falecidos). Também não esqueço a boa relação de amizade estabelecida entre Yara e a minha irmã Conceição. Eram parceiras de estudos (apesar de Conceição haver se dedicado ao campo da Matemática e Yara a Literatura), de passeios, das idas ao cinema e, certamente, das muitas traquinagens juvenis, como é natural a todos nos primeiros anos da juventude.  

A jornalista Yara Belchior de Sá era psicanalista e bacharela em Letras pela Universidade Federal de Sergipe. Ao ingressar no jornalismo foi orientada por dois grandes nomes da imprensa aracajuana: Waldomiro Junior (desde o início do século XXI ele se transformou em um influente jornalista baiano, vivendo em Salvador) e Gilvan Manoel, respeitado e persistente editor da mídia impressa em Sergipe.

Yara começou sua atividade jornalística como revisora. Passou para a reportagem, atuou como “foca”, foi setorista, principalmente na área de política, cobrindo as sessões da Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe. Ao longo da sua carreira de jornalista, Yara trabalhou no Jornal da Cidade, Jornal de Sergipe, Jornal da Manhã, Gazeta de Sergipe, TV Sergipe e foi correspondente da revista Veja.

Aos poucos descobriu e foi migrando para o gênero que a projetou profissionalmente – a coluna social. Foi colunista social em diferentes veículos da mídia impressa, em Aracaju. Por último, manteve uma coluna no Portal Infonet, o seu derradeiro trabalho. Sempre que eu conversava com Yara costumávamos falar sobre a vida. Ela gostava de dizer que nasceu na Bahia e foi feliz em Sergipe. Em 1996 foi reconhecida e recebeu da Assembleia Legislativa o título de cidadã sergipana.

Nos últimos 10 anos a saúde de Yara foi aos poucos ficando frágil. O corpo da mulher exuberante foi tomado pela obesidade e algumas enfermidades como o diabetes e outras doenças oportunistas que daí advieram foram aos poucos lhe tirando a mobilidade e provocando o seu afastamento gradativo do convívio social.

Tentei nos últimos cinco anos gravar com ela um depoimento memorialístico, uma entrevista sobre a sua história de vida, como gosto de fazer com as pessoas que considero importantes. Humilde, ela nunca aceitou. Se esquivava dizendo que teve uma vida comum e não tinha nada a acrescentar.

Perdemos Yara. Ela partiu aos 64 anos de idade. É hora de dizer adeus, sentir saudades e anunciar que ela nos fará muita falta. 

 

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