Jorge
Carvalho do Nascimento*
Depois
da publicação do meu recente texto a respeito da implantação em 1929 da telefonia
na vila de Muribeca, alguns amigos me procuraram para oferecer informações e
fontes a respeito de uma possível história da telefonia em Sergipe. Uma das
melhores contribuições que eu recebi foi do economista e pesquisador de
História Luiz Fernando Ribeiro Soutello, membro da Academia Sergipana de
Letras.
Mantive
duas boas conversas com Soutello, ao telefone, sobre o assunto e recebi dele
dois e-mails, ricos em informações. Luiz Fernando localizou dentre os documentos
que pertenceram ao seu pai, o engenheiro eletricista Antônio Ribeiro Soutello,
uma pasta rica em registros que contribuem para, ao lado de outras fontes, compor
um mosaico indiciário que possibilita dar sentido à história da telefonia no
Estado de Sergipe.
Com
base nas informações que recebi de Luiz Fernando Ribeiro Soutello, na Usina
Castelo, em Santa Luzia do Itanhi, que pertenceu ao seu bisavô, a telefonia
chegou em 1914, 15 anos antes da instalação do serviço em Propriá e Muribeca. É
verdade que um fato trágico acelerou a chegada do telefone a Usina Castelo.
O
próprio Soutello fez um relato da situação, afirmando que naquele ano, “uma
tia-avó minha teve uma dor após o almoço. Foi necessário mandar um mensageiro à
Estância para chamar um médico”. Jessé Fontes (avô de Clodoaldo Alencar Filho,
professor de Literatura Inglesa, ex-reitor da Universidade Federal de Sergipe e
membro da Academia Sergipana de Letras) era o esculápio que atendia as
populações do sul de Sergipe, no início do século XX.
Morava
na cidade de Estância e de lá, quando necessário, ia a Santa Luzia e Espírito
Santo (atualmente, Indiaroba) para atender as demandas da população e passava
pelos engenhos e fazendas para cuidar da saúde das pessoas das famílias mais
abastadas. As estradas eram rudimentares e as viagens eram feitas a cavalo ou
em saveiros, o que tornava o tempo de deslocamento muito longo.
O
fato é que o mensageiro partiu da Usina Castelo com a missão de buscar o médico
Jessé Fontes. Quando os dois chegaram, a tia-avó de Luiz Fernando Ribeiro
Soutello já estava morta, levada por uma crise de apendicite que poderia ser
curada, mas a demora no atendimento determinou o desfecho fatal.
O
episódio levou Cantidiano Vieira, o bisavô de Soutello e proprietário da usina,
a adquirir um telefone movido a pilha e estender uma linha telefônica de arame fixado
em postes, ligando a sua propriedade à casa de um irmão. Dali, uma outra linha
em arame conectava com uma outra propriedade da família e mais uma outra linha
levava a conexão até a loja comercial de Salvador Nóbrega de Mendonça, em
Estância.
Os
bons serviços prestados por aquele primeiro telefone, tanto na troca de
informações entre as pessoas da família quanto na celeridade que deu aos negócios
do engenho, entusiasmaram Cantidiano Vieira a fazer um investimento bem mais
ousado e ele implantou uma espécie de central telefônica, interligando o
sobrado onde residia com o escritório, a caixaria, uma outra casa de sua
propriedade (onde viveram os avós e os pais de Luiz Fernando Ribeiro Soutello),
a sua casa da Ribeira (onde havia um trapiche) e duas outras fazendas suas: a
Pagão e a Taquara, esta última em Indiaroba.
Com
o novo sistema, a partir da Fazenda Taquara era possível falar com os
escritórios que Cantidiano Vieira mantinha no Rio de Janeiro. Obter a linha era
uma operação complexa e algumas vezes muito demorada. Era feito inicialmente o
enlace entre a Taquara, o engenho, em Santa Luzia, e a cidade de Estância. Dali,
uma nova ligação com a Radional, em Aracaju (funcionava no andar térreo do edifício
da Associação Comercial de Sergipe, à rua José do Prado Franco).
Algumas
vezes se esperava durante um dia inteiro e somente no dia seguinte era possível
concluir todas as conexões e falar com a cidade do Rio de Janeiro. Mas, era um
grande avanço e facilitava bastante as comunicações e a realização dos negócios
que antes demoravam semanas esperando pelo vai-e-vem das cartas e do serviço
nem sempre eficaz dos Correios.
As
comunicações eram tão importantes que a Usina Castelo mantinha um funcionário
encarregado de gerenciar as estradas e as linhas telefônicas. É fundamental
registrar que além da Usina Castelo, em Santa Luzia do Itanhi também as usinas
Priapu e São Félix mantinham centrais telefônicas próprias que aceleravam os
contatos e asseguravam a celeridade nos negócios.
O
engenheiro Antônio Ribeiro Soutello costumava contar, em tom de blague, que
certa feita Raimundo Menezes (dono da Usina Priapu e tio da escritora Luzia
Costa Nascimento) teve necessidade de falar com Constâncio Vieira, na firma
Vieira Sampaio, em Aracaju. A conexão estava difícil. Em Estância, a
telefonista (uma senhora daquelas que à época costumavam chamar de moça velha) entrou
em ação e falou em tom enérgico com uma telefonista do posto da cidade de Itaporanga
d’Ajuda, gritando: “Itaporanga, minha nega, acabe com esta conversa e saia da
linha que o Sr. Raimundo Menezes quer falar com Vieira Sampaio”. Rapidamente a
conexão foi estabelecida.
*Jornalista,
professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e
presidente da Academia Sergipana de Educação.
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