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PARA ONDE VAI A COLUNA SOCIAL? – XXVIII

                                           Piscina da Associação Atlética de Sergipe

 

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

Paulo Nou afirma que o jornalismo e a coluna social o ajudaram a amadurecer muito, principalmente do ponto de vista da compreensão das relações sociais e das relações políticas. De modo mais visível, depois que ele começou a assinar a coluna social do jornal Diário de Aracaju.

Além de realizar o trabalho comum aos diversos gêneros do jornalismo, como pautar reportagens, editar textos, redigir, publicar colunas, sempre foi também práticas dos jornalistas dedicados a coluna social, a atividade de promoter e organizador de eventos que mobilizavam os grupos sociais da elite.

O jornalista Paulo Nou, titular de coluna social nos jornais Gazeta de Sergipe e Diário de Aracaju no período de 1969 a 1973, revelou em depoimento ao autor deste texto algumas festas organizadas por ele e por colunistas sociais influentes em Sergipe, como João de Barros e Pedrito Barreto.

“Eu e Barrinhos, o João de Barros, nos aproximamos no Diário de Aracaju. Ele passou a fazer festa comigo. Nós fizemos a famosa festa do 14 de julho na Boate Oxente, do Cotinguiba Esporte Clube. Estávamos festejando a Revolução Francesa. Um sucesso. Uma fila enorme na porta da Boate. A festa terminou com a Polícia Federal presente.

Tocaram a Marseillese, porque era uma festa com o apoio da Aliança Francesa. Tinha um participante, meio de pileque, que disse que aquilo não era possível e exigiu que tocasse o Hino Nacional Brasileiro. Tocou o Hino Nacional. Um outro participante saiu da Boate, foi em casa e ligou para a Polícia Federal dizendo que estavam tocando o Hino Nacional dentro de uma boate.

Os tempos eram outros. De ditadura militar. Veio a Polícia Federal. Mas, foi uma grande festa. A gente sabia que ninguém ia ser preso por causa disto, a festa continuou e ponto final”.

Além de organizar festas, fazia parte da prática dos jornalistas dedicados a coluna social frequentar as principais festas e eventos que aconteciam em Aracaju. Nas décadas de 50, 60 e 70 do século XX, a Associação Atlética de Sergipe e o Iate Clube de Aracaju eram os espaços nos quais ocorriam os encontros que reuniam as personalidades de maior expressão dos grupos sergipanos pertencentes a elite econômica e social.

A Associação Atlética, de acordo com o jornalista Paulo Nou, “era um clube para ir durante o dia. Porque o Iate Clube, na época, ainda era um espaço físico muito apertado, diferente do que é nos dias atuais”. A Associação Atlética dispunha de um parque aquático, com boas piscinas e uma caixa destinada a prática de saltos ornamentais. Contava também com quadras destinadas a esportes como futebol de salão, basquetebol e voleibol, além de duas boas quadras de tênis. Na estrutura do clube, também existia um salão de festas, um bar, um restaurante e uma boate.

O clube “era um lugar onde a gente ia no sábado. Tinha as quadras de tênis e a piscina e o movimento esportivo era muito grande. Tinha várias cadeiras em volta da piscina onde a gente sentava para bater papo, tomar uma cerveja, jogar conversa fora. Era o nosso clube, a nossa área era ali”. O restaurante Catavento era bem frequentado, principalmente à noite e era um requisitado espaço de festas. O jornalista Pedrito Barreto organizou várias festas no Restaurante e Boate Catavento, como a festa da Glamour Girl e algumas festas temáticas.

De acordo com a interpretação de Paulo Nou, a elite sergipana migrou cada vez mais intensamente da Associação Atlética para o Iate Clube porque aos poucos a Atlética foi se transformando num clube no qual houve um afrouxamento das exigências em relação àqueles que podiam frequentá-lo. O clube tinha vida, muita vida.

Segundo Paulo Nou, “em determinado momento, a Associação Atlética começou a aceitar pessoas que não faziam parte de um certo grupo, como sócios, no que ela fez muito bem. Entraram altos funcionários do Banco do Brasil e de outros bancos, cujas famílias não tinham tradição.

Enfim, foram admitidos grupos de classe média que estavam ganhando dinheiro. Políticos que não eram filhos da elite, comerciantes que prosperaram. Mas, eles não eram filhos de nenhuma família importante. A elite se estabeleceu no Iate Clube de Aracaju e começou a organizar festas fechadas a um grupo ao qual nem todos poderiam ter acesso.

Mesmo muitas pessoas que tinham elevado poder econômico eram vistas preconceituosamente e sofriam restrições para participar das atividades do Iate Clube de Aracaju. Os eventos do Iate começaram a se diferenciar, como a Festa das Rosas e a celebração dos bailes de Carnaval”.

Diz Paulo Nou que “as festas fechadas do Iate terminavam sendo chatas, porque uma festa onde todo mundo se conhece não é legal, não acontece nada de novo”. Por essas características, ainda segundo ele, “a melhor festa que aconteceu no Iate foi a comemoração dos 100 anos da loja A. Fonseca.

Todos os sócios do clube foram convidados, mas a festa foi aberta para outras pessoas que não eram associadas ao Iate. Foi uma festa fantástica. A festa mais luxuosa que já aconteceu em Aracaju. Nunca tinha existido nada igual. Os vestidos das mulheres, os trajes de gala dos homens, as pessoas, parecia uma festa em Hollywood”.

O seu entendimento é o de que a elite sergipana se fechou no Iate para permanecer restrita a famílias tradicionais e barrar a entrada dos novos ricos no meio deles.

 

 

*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
 

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