Pular para o conteúdo principal

PARA ONDE VAI A COLUNA SOCIAL? - XLI

                                                     Antônio Carlos Magalhães

 

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

O jornalismo é um negócio? Há neutralidade na atividade dos jornalistas ou eles são passionais? Estas são questões presentes no debate contemporâneo a respeito do jornalismo que estimulam diferentes respostas e múltiplas reflexões. Este texto reflete os posicionamentos do jornalista Ancelmo Gois acerca deste tema.

Entrevistado pelo autor do presente texto, Ancelmo afirma entender atualmente que o jornalismo tem lado. Porém, diz ser necessário acreditar na isenção como uma utopia e apresenta um exemplo contundente. “Eu só acreditarei no jornal isento no dia que o jornal Observatório Romano, do Vaticano, toda vez que falar em Deus der também a opinião do Diabo, que é o outro lado”.

Certamente esta possibilidade levantada pelo experiente homem de imprensa nunca vai acontecer. Por tal razão, ele sustenta que a condição humana impossibilita a imparcialidade. “Você tem dois filhos. Deve dar 50 por cento de afeto a um e 50 por cento de afeto a outro. Não adianta. De vez em quando você está beijando mais a menina que o menino”.

São muitos os exemplos da parcialidade da mídia. Recentemente, ao acompanhar o noticiário das eleições para presidente dos Estados Unidos da América em 2020, todos perceberam na mídia norte-americana que cada jornal tinha um lado, tinha o seu candidato. Quem observar a cobertura das grandes redes de televisão, também perceberá o mesmo comportamento. As eleições transmitidas pela Fox eram de um tipo, enquanto as transmissões da rede CNN apresentam outras eleições distintas.

Segundo Ancelmo Gois, o problema da posição que os jornalistas e os veículos de comunicação adotam é a desonestidade. “Pouco importa se o jornal é petista, desde que o repórter vá na rua e veja uma manifestação com 15 petistas e não diga no dia seguinte que tinha 30. Se ele fizer isto, estará praticando uma desonestidade factual”.

Interpretações como esta indicam que cada vez mais o jornalismo tem se entusiasmado com o adjetivo e cada vez menos com o substantivo. Isto é fato. Por tal razão, não há problema que o jornal, o rádio, a TV, as plataformas da rede mundial de computadores assumam posição. A desonestidade e a falta de ética na disseminação de informações, contudo, são inadmissíveis.

Há práticas com as quais é impossível concordar. É inaceitável a publicação de notas ou informações cujas fontes não sejam confiáveis, quando estas podem comprometer a reputação e a imagem pública das pessoas. Em situações assim, é necessário que o noticiário e as análises que emitem opinião demonstrem muito equilíbrio e segurança.

Ancelmo Gois reafirma que o fundamental é esclarecer ao leitor que o jornal e o jornalista optaram por um lado, possuem uma posição e esclarecer exatamente a partir de qual perspectiva o veículo está falando. Ancelmo cita a imprensa internacional para dar força a sua argumentação. “Antigamente se dizia o seguinte: na Europa você chega em Paris, vai numa banca de jornal e vê lá Le Humanitée. Você sabe que é o jornal dos comunistas. Pega outro jornal, é de direita. Outro, é de centro esquerda”.

Padrões como estes, que sempre foram comuns na imprensa europeia, atualmente estão se transformando em coisas recorrentes na imprensa norte-americana. Nas eleições de 2020 tudo ficou muito explicitado nos Estados Unidos da América. Era tradição do New York Times manter neutralidade no noticiário e declarar o voto no Editorial. Assim, vendia para o leitor a presunção de que os demais espaços do periódico eram independentes.

O jornalista Ancelmo Gois está convencido de que, na verdade, a mídia nunca foi independente. “Eu tinha um amigo chamado José Silveira. Ele dizia que teve um acidente na porta da casa dele. O Globo contou de uma maneira, o Jornal de Brasil contou de outra e O Dia contou de outra maneira. O mesmo acidente que ele viu. Você é humano, você tem o seu olhar”.

O jornalismo é um negócio? Na verdade, o jornalismo é uma atividade humana que, como todas as outras, contém conflitos de interesses. A medicina é um negócio? É e não é. A engenharia é um negócio? É e não é. Do mesmo modo que a medicina, a engenharia, a advocacia, o jornalismo é um negócio e não é um negócio.

Segundo Ancelmo Gois, o problema da imprensa brasileira não é ser negócio ou deixar de ser negócio. “Se você pegar um carro e parar na primeira cidade que aparecer, se tiver um site lá, ele é do prefeito ou do ex-prefeito. Evidentemente, o financiamento público dessa maneira que é praticado é inadmissível”.

Por fim, Ancelmo esclarece didaticamente este seu exemplo: “Se você for ao Nordeste do Brasil, o maior empresário de comunicação da Bahia é a família herdeira do senador Antônio Carlos Magalhães. Se você for a Sergipe, é a família do ex-governador Albano Franco. O maior empresário de comunicação de Alagoas, é a família Collor. O maior empresário de comunicação do Rio Grade do Norte é a família de Aloísio Alves. O maior empresário de comunicação do Maranhão é a família Sarney”.

 

 

*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A MORTE E A MORTE DO MONSENHOR CARVALHO

  Jorge Carvalho do Nascimento     Os humanos costumam fugir da única certeza que a vida nos possibilita: a morte. É ela que efetivamente realiza a lógica da vida. Vivemos para morrer. O problema que se põe para todos nós diz respeito a como morrer. A minha vida, a das pessoas que eu amo, a daqueles que não gostam de mim e dos que eu não aprecio vai acabar. Morreremos. Podemos mitologizar a morte, encontrar uma vida eterna no Hades. Pouco importa se a vida espiritual nos reserva o paraíso ou o inferno. Passaremos pela putrefação da carne ou pelo processo de cremação. O resultado será o mesmo - retornar ao pó. O maior de todos os problemas é o do desembarque. Transformamo-nos em pessoas que interagem menos e gradualmente perdemos a sensibilidade dos afetos. A decadência é dolorosa para os amigos que ficam, do mesmo modo que para os velhos quando são deixados sozinhos. Isolar precocemente os velhos e enfermos é fato recorrente, próprio da fragilidade e das mazelas da socied...

O LEGADO EDUCACIONAL DE DOM LUCIANO JOSÉ CABRAL DUARTE

  Jorge Carvalho do Nascimento     A memória está depositada nas lembranças dos velhos, em registros escritos nas bibliotecas, em computadores, em residências de particulares, em empresas, no espaço urbano, no campo. Sergipe perdeu, no dia 29 de maio de 2018, um dos seus filhos de maior importância, um homem que nos legou valiosos registros de memória que dão sentido à História deste Estado durante a segunda metade do século XX. O Arcebispo Emérito de Aracaju, Dom Luciano José Cabral Duarte, cujo centenário de nascimento celebramos em 2025, foi uma das figuras que mais contribuiu com as práticas educacionais em Sergipe, sob todos os aspectos. Como todos os homens de brilho e com capacidade de liderar, despertou também muitas polêmicas em torno do seu nome. Ao longo de toda a sua vida de sacerdote e intelectual da Educação, Dom Luciano Duarte teve ao seu lado, como guardiã do seu trabalho e, também da sua memória, a expressiva figura da sua irmã, Carmen Dolores Cabral Duar...

A REVOLTA DE 13 DE JULHO, OS SEUS REFLEXOS SOCIAIS E OS MÚLTIPLOS OLHARES DA HISTÓRIA

      José Anderson Nascimento* Jorge Carvalho do Nascimento**                                                                                              Qualquer processo efetivamente vivido comporta distintas leituras pelos que se dispõem a analisar as evidências que se apresentam para explicá-lo. Quando tais processos são prescrutados pelos historiadores, a deusa Clio acolhe distintas versões, desde que construídas a partir de evidências que busquem demonstrar as conclusões às quais chega o observador. Historiadores como...