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PARA ONDE VAI A COLUNA SOCIAL? - XXXVIII


  

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

“Eu sempre desconfiei que o mundo está cheio de idiotas. A internet veio provar que eu tinha razão”. O jornalista Ancelmo Gois cita a frase do seu colega Carlos Heitor Cony para afirmar que a rede mundial de computadores divulga todo tipo de informação e que cabe à imprensa profissional fazer uma curadoria, ser o curador.

Ancelmo entende que é possível publicar nas diferentes plataformas da internet absurdos de todo tipo. Todo tipo de coisa é divulgada e circula. “Você precisa de uma curadoria e este é o papel do jornalista. Quando morreu Michael Jackson, a internet na Califórnia estava se expandindo e o primeiro a noticiar foi um blog de fofocas que já tinha matado Michael Jackson três vezes. As pessoas só passaram a acreditar que Michael Jackson morreu quando o site do Los Angeles Time disse que Michael Jackson morreu”.

Sob a interpretação de Ancelmo, quando uma empresa como o Los Angeles Time informa que Michael Jackson morreu, a credibilidade daquela informação é abonada por uma tradição de 70 anos de jornalismo. As pessoas passam, por isto, a acreditar que é verdade. Este, para ele, é o papel do jornalismo profissional.

Para dar força ao seu argumento, Ancelmo Gois acresce um outro exemplo. “Se você disser Albano vai vender uma fábrica, se disser isto na internet, é uma coisa. Mas, se a jornalista Miriam Leitão disser Albano vai vender uma fábrica, as pessoas acreditam, porque ela faz a curadoria dessa informação. Há uma overdose de informação”.

Por tudo isto, em nosso tempo, saber das novidades, apurar as novidades melhor do que os outros, é o papel do jornalista profissional, porque ele é formado com algumas habilidades que lhes permitem saber o que é informação melhor ou pior, mais relevante ou menos importante.

De acordo com Ancelmo Gois, isto não quer dizer que o jornalista é infalível. “A gente erra. Se for para discutir como erra, a gente vai discutir durante umas cinco horas. De um modo geral, a gente aprende algumas dicas, aprende a conhecer as fontes. Por exemplo: uma das grandes fontes do Brasil foi o Antônio Carlos Magalhães. Todo mundo fala, mas ele era uma fonte confiabilíssima. O que ele dissesse pra você era informação segura, verdadeira. Não precisava checar muito. Ele não colocava jornalista em fria”.

Aprender as práticas de apurar informação é um exercício diário dos jornalistas profissionais. Os que atuam nos grandes veículos da mídia aprendem que não devem colocar notícias de bancos em dificuldade, sem antes checar muitas vezes. Esse tipo de noticiar sobre bancos em dificuldades antes de checar muitas vezes a informação. Esse tipo de notícia provoca uma corrida aos bancos e um frenesi na economia, inquietando toda a população. Por isto é necessário que o jornalista se certifique absolutamente da sua veracidade.

Para Ancelmo Gois, o desenvolvimento dessas habilidades é permanente para todos os jornalistas. “A gente vai aprendendo na escola esses mecanismos de apuração mais sofisticados e vai fazendo também uma curadoria. Eu acredito que apesar de grandes vitórias, a profissão atravessa uma crise brutal”.

Para dar um exemplo didático do modo como ele vê a crise do jornalismo, Ancelmo Gois cita a biografia do jornalista Samuel Weiner, publicada em livro, fazendo referência ao fato de a cidade do Rio de Janeiro ter vivido um momento no qual circulavam diariamente 13 jornais.

Atualmente, é muita pequena a circulação de jornais no Rio de Janeiro e nas demais cidades brasileiras. Todavia, Ancelmo Gois acredita na importância do papel da mídia impressa. “A sociedade não vai deixar morrer esse trabalho, agora está difícil. Você pega o jornal O Dia, é um jornal que já teve mais de um milhão de exemplares. Hoje tem 20 mil exemplares”.

O entendimento de Ancelmo para explicar a queda na tiragem dos jornais remete ao papel social atualmente exercido pela internet. Até a popularização da rede mundial de computadores um leitor comum comprava jornal para saber notícias do time de futebol pelo qual ele torce. Contemporaneamente, ele acessa o site do clube dele na rede ou alguma plataforma especializada em esportes e tem informações mais abundantes e atualizadas do que aquilo que qualquer jornal pode oferecer.

De acordo com Ancelmo Gois, além do futebol, são vários elementos da vida cotidiana que anteriormente as pessoas buscavam nos jornais e agora recebem informações mais atualizadas pela internet. “Temperatura: os jornais todos tinham grandes mapas dando informação sobre o tempo”. Melhor se informar pela internet.

Todavia, há um outro lado dessa questão que remete a leitores que buscam análises confiáveis. E os jornalistas mais importantes ainda continuam escrevendo para os jornais, em suas edições impressa e eletrônica. Nomes de grandes analistas como Dorrit Harazim, Élio Gáspari, Miriam Leitão continuam a ser indispensáveis.

 

 

*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.

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