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A COVID-19 E A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO


  

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

Desde março do ano passado, quando a Organização Mundial de Saúde decretou que estávamos vivendo uma pandemia, tenho acompanhado habitualmente os textos publicados por três amigos que admiro. Dois deles, médicos: Antônio Samarone de Santana e Antônio Carlos Sobral Sousa. Da mesma maneira, o juiz de Direito José Anselmo de Oliveira.

Ao menos uma vez por semana cada um deles publica um texto tratando dos problemas relacionados a Covid-19. Samarone, médico sanitarista, professor de Saúde Pública e de História da Saúde da Universidade Federal de Sergipe, tem dedicado as suas reflexões a pensar as políticas de saúde em face da necessidade do gerenciamento da crise. É membro da Academia Sergipana de Medicina, da Sociedade Médica de Sergipe e da Academia Sergipana de Educação.

Os textos de Antônio Carlos Sousa assumem o viés que aborda as questões terapêuticas propriamente ditas, os problemas de gestão do ambiente hospitalar e os cuidados que cada cidadão deve ter para evitar o próprio contágio e também o daquelas pessoas com as quais convive cotidianamente.

Professor de Cardiologia da Universidade Federal de Sergipe, cardiologista reconhecido pelas suas pesquisas na área e pelos procedimentos na prática de clinicar, Sousa se entregou ao tratamento da doença com a dedicação de um médico recém formado que ainda dá os primeiros passos na prática médica. Sousa é membro das Academia Sergipana de Letras e, como Samarone, integra a Academia Sergipana de Educação, Academia Sergipana de Medicina e também a Sociedade Médica de Sergipe.

José Anselmo de Oliveira é magistrado do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, mestre m Direito Constitucional pela Universidade Federal do Ceará, membro da Associação Mundial de Direito Médico e da Associação Argentina de Justiça Constitucional. Anselmo é fundador da Sociedade de Direito Médico do Estado de Sergipe – Sodime.

Da mesma maneira que Sousa, Anselmo é membro da Academia Sergipana de Letras e da Academia Sergipana de Educação. Além disto, integra a Academia Sergipana de Letras Jurídicas. Em agosto de 2020 ele organizou o I Congresso Internacional Online de Direito Médico da Sodime.

Acabo de fazer a leitura do artigo “Cambio de Paradigmas em la Determinación de la Responsabilidad del Estado Ante la Pandemia”, publicado por Anselmo no livro de Anais do congresso citado acima. Os Anais foram organizados pelo próprio autor do texto citado juntamente com o professor Plauto Cardoso, professor de Direito Constitucional e diretor do Instituto de Direito de Integração da Associação Argentina de Justiça Constitucional.

Edição bilingue, em Português e Espanhol, o livro de Anais reuniu textos de sete pesquisadores que participaram do Congresso de 2020. Além dos dois já citados, também Eduardo Olivero, Federico José Gallo Quintián, Hernán Gustavo Lombardia, Jones Figueirêdo Alves e Maria Carolina Estepa Becerra.

O artigo de Anselmo aborda um tema que ainda vai render exaustivos debates nos tribunais brasileiros. A discussão gira em torno da questão da responsabilidade civil do Estado em face da pandemia e as mudanças de paradigma quanto a sua investigação, em função dos excludentes de responsabilidade civil previstos pela lei e pela doutrina.

Inicialmente, o autor debate o problema da responsabilidade civil nas tradições do ordenamento jurídico brasileiro, apanhando a Constituição de 1988 como ponto de partida para as suas reflexões. Lança luzes interpretativas sobre o artigo 37 e o modo como este aborda os compromissos das pessoas jurídicas de Direito público e de Direito privado.

Pensa o problema da pandemia diante do debate a respeito das excludentes de responsabilidade civil objetiva nos casos de culpa exclusiva da vítima, de culpa exclusiva de um terceiro, de força maior e de caso fortuito.

Conclui chamado a atenção para as balizas que sempre serviram para orientar a responsabilidade civil do Estado e o reconhecimento da sua obrigação de reparar os danos. Para ele tais balizas não vão servir aos casos que chegarão ao Poder Judiciário. O seu entendimento é o de que as normas ordinárias não se aplicarão aos casos de excepcionalidade.

Aponta que o maior desafio para os juízes e tribunais será o de definir outros paradigmas para encontrar as soluções mais justas e adequadas, considerando cada caso e as suas circunstâncias. Neste debate, não deixa de considerar o fato de que sairemos da pandemia imersos em uma crise econômica global sem precedentes, com a queda do Produto Interno Bruto de todos os países, aumento do desemprego, crescimento das dívidas interna e externa, queda de investimentos em infraestrutura e desenvolvimento, além de um saldo de mortes e pessoas com sequelas que obrigarão o estado a oferecer maior assistências às suas famílias.

 

 

*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.

Comentários

  1. Agradeço a análise do meu artigo publicado no livro Anais do I Congresso Internacional online de Direito Médico, de forma tão minuciosa e competente.

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