Jorge
Carvalho do Nascimento*
Neste
feriadão de Páscoa, descobri que além das muitas qualidades que sempre aplaudi
nas memórias do advogado Osório de Araujo Ramos, há mais uma que me entusiasma
e que eu desconhecia. Como eu sou, ele foi um torcedor fervoroso do Clube de
Regatas Vasco da Gama.
Sempre
admirei o compromisso social que marcou a vida daquele importante operador do
Direito. A militância no Partido Comunista Brasileiro – PCB lhe causou muitos
dissabores e o levou à prisão durante nove meses, ainda estudante da primeira
turma da Faculdade de Direito de Sergipe.
Osório
fora secretário-geral do Partidão enquanto este se manteve na legalidade, até 1947.
Em 10 de dezembro de 1952, ele foi preso sob a acusação de reorganizar o
Partido Comunista em Sergipe. Inicialmente foi levado a uma cela da Capitania
dos Portos e em seguida foi transferido às dependências do Isolamento, um
edifício anexo à Penitenciária de Aracaju, no bairro América, onde permaneceu
durante nove meses.
Quando
da prisão, aos 37 anos de idade, Osório de Araujo Ramos teve sua casa invadida
pela Polícia e foi acusado de liderar o grupo de comunistas do qual
participavam também Nelito Nunes de Carvalho, Antônio Correa dos Santos,
Lourival Pinheiro de Melo, Renato Mazze Lucas, Gilberto Teles de Menezes, José
Rosa de Oliveira Neto, Robério Garcia, Fragmon Carlos Borges, Maria Helena
Mota, Verdi Plech e Manoel Franco Freire.
Tudo
foi consequência do trabalho da chamada Comissão Pena Boto, mais um momento da
paranoia anticomunista que persegue os grupos mais conservadores da sociedade
brasileira e periodicamente se manifesta. Sobre o desequilíbrio emocional do
almirante Pena Boto, que comandou aquele processo de caça aos comunistas, o jornalista
Luiz Eduardo Costa fez um comentário definitivo:
“Era
um extremado intolerante, ao qual incomodava a simples ideia de presença popular
na cena política, de reivindicações, partidas fossem de onde fossem, dos seus
próprios comandados, marinheiros, ainda discriminados, ou de qualquer setor que
representasse a voz subjugada do povo”.
A
leitura que fiz este final de semana do livro DIREITO COMO OFÍCIO, VIDA COMO
CAUSA: DR. OSÓRIO DE ARAÚJO RAMOS valeu a pena não apenas pela revelação do entusiasmo
vascaíno e pelo que os autores escreveram acerca da militância política de
Osório Ramos no Partido Comunista Brasileiro - PCB e na União Democrático
Nacional – UDN.
Sayonara
Rodrigues Viana e Claudefranklin Monteiro produziram um bom texto
memorialístico, apresentado ao leitor em um volume de 133 páginas, com um
design criativo e excelente acabamento gráfico. As orelhas da publicação
recebem a assinatura do professor Eduardo Macedo, da Academia Sergipana de
Letras Jurídicas, enquanto o prefácio tem como autor o professor Gilton Garcia,
membro da Academia Sergipana de Letras.
O
ensaio apresenta uma história de vida e do ambiente familiar de Osório de
Araujo Ramos, desde o seu nascimento em 1918 até a sua morte, em 1986. O
aracajuano Osório, antes de estudar Direito, obteve formação em Contabilidade e
atuou no Serviço Público Estadual, chegando a chefiar o Tesouro do Estado durante
a gestão do governador Leandro Maciel.
Depois
que colocou grau em Direito, no ano de 1955, se estabeleceu como advogado.
Colando grau na primeira turma da Faculdade de Direito de Sergipe, teve como
colegas de turma Aída Prado Leite Teles, Antônio Vieira Barreto, Durval Lima
Santos, Gibson de Almeida Pinho, Ismael Costa Moura, José Barroso, José Carlos
de Sousa, José Maurício Botto de Barros, Luiz Bispo, Luiz Otávio de Aragão e
Maria da Conceição Cardoso Ribeiro.
Concursado,
ingressou na magistratura após tomar posse, em 1958, como juiz de Direito da
Comarca de Riachão do Dantas. Iniciou ali uma aplaudida carreira de magistrado
que o levou às comarcas de Lagarto e Estância, onde se aposentou em 1968.
Após
a aposentação retornou à advocacia e foi militante na gestão da Ordem dos
Advogados do Brasil, onde atuou como tesoureiro, primeiro-secretário e
presidente. Também exerceu mandato de membro do Conselho Federal da OAB.
Durante
o período em que viveu na cidade Estância, Osório ingressou na Loja Maçônica
Piauhytinga e após a sua aposentadoria, novamente estabelecido em Aracaju,
ingressou na Loja Maçônica Cotinguiba
A
figura de Osório de Araujo Ramos encarna o entendimento do historiador francês Jacques
Le Goff e de outros estudiosos que emergiram com o movimento da Nova História
Cultural: a singularidade do indivíduo é reveladora de diferentes expressões e
movimentos da vida social.
Assim,
o biografado expressa a vida dos estudantes e dos servidores do Poder Executivo
em Sergipe durante a primeira metade do século XX. Revela as agruras da
militância política de esquerda, em torno da qual persistem muitos
preconceitos. É a história da magistratura e da advocacia.
Uma
contribuição original aos estudos de História de Sergipe.
*Jornalista, doutor em Educação, professor aposentado do Departamento de História, do Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. É membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
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