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ANA MEDINA, CLAUDEFRANKLIN MONTEIRO, “PEBAS” E “CABAÚS”


  

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

Quando Fausto Cardoso morreu, em um dia 28 de agosto do ano de 1906, os que se dedicavam a analisar a política sergipana naqueles primeiros anos do regime republicano entre nós entenderam que as tensões haviam chegado ao seu clímax. Advogado, deputado federal, professor, poeta e jornalista, Fausto foi morto por um tiro na porta do Palácio do Governo, em Aracaju, quando tentava impedir que se cumprisse a ordem judicial que recolocava Guilherme Campos, o presidente de Sergipe que exercia o mandato por ter sido eleito para o cargo, de volta ao poder.

O que ninguém esperava era que a morte de Fausto fosse somente o início da crise. Decorridos 69 dias, em nove de novembro do mesmo ano de 1906, o irmão de Guilherme Campos, o jornalista, sacerdote, professor e senador da república, Olympio Campos, fosse assassinado no Rio de Janeiro.

Olympio havia acabado de sair de uma sessão do Senado e atravessava a Praça 15 de Novembro quando foi abordado pelos filhos de Fausto Cardoso, Armando e Humberto de Aguiar Cardoso, e pelo primo deles, Délio Guaraná de Barros. Foram 11 tiros e duas facadas.

Na última semana, os escritores Ana Maria Fonseca Medina e Claudefranklin Monteiro autografaram o livro AS EXÉQUIAS DO MONSENHOR OLYMPIO CAMPOS, trabalho referencial. A brochura tem 241 páginas, com orelhas assinadas pelo professor José Araujo Filho e por Dom Fernando Gomes.

O advogado Evaldo Campos foi convidado a assinar o prefácio enquanto o padre Gilvan Rodrigues dos Santos é o autor da apresentação. O trabalho publicado pela Editora Criação traz em sua capa uma fotografia do cortejo fúnebre, quando da chegada dos restos mortais do monsenhor a Aracaju, em novembro de 1906.

Os autores construíram um bem-organizado registro memorialístico no qual discutem os últimos momentos do senador no Rio de Janeiro, a concepção e execução do crime, o momento da morte e a autópsia do cadáver, o processo de embalsamamento do corpo, a viagem dos restos mortais do Rio de Janeiro a Aracaju, os ritos da chegada do cadáver, o velório e as homenagens.

O trabalho discute também os registros acerca do perfil do monsenhor Olympio Campos publicados por intelectuais e lideranças da vida política de Sergipe, após a morte do senador. Do mesmo modo, dedicam algumas páginas para comentar os embates entre olimpistas e faustistas, o governo do monsenhor no comando do Estado, a campanha eleitoral que o levou ao Senado e as formas sob as quais a sua memória foi cultuada.

Muito importantes são os anexos trazidos pelo livro a partir da página 191. Ali é apresentado um quadro que demonstra as repercussões que ganhou a política de Sergipe no cenário nacional com as mortes de Fausto Cardoso e Olympio Campos. Da mesma maneira, a vida escolar e eclesiástica do senador.

A análise da vida política de Olympio Campos sob a monarquia e a república esclarece várias posições tomadas por ele e muitos embates do qual participou, principalmente ao exercer o governo e a direção do seu partido. Por fim, chama a atenção um artigo publicado no Rio de Janeiro por José do Patrocínio, analisando a chamada política dos governadores.

Ana Medina e Claudefranklin Monteiro chamam a atenção para o fato de que não obstante haver se transformado num dos mais importantes dentre os chefes políticos sergipanos, fora o embate que o sacerdote havia travado ao se posicionar contrariamente a reforma do ensino do governo Inglês de Souza que levou Olympio Campos a postular o seu primeiro mandato no parlamento de Sergipe.

Em sua reforma do ensino, Inglês de Souza havia revogado a obrigatoriedade do ensino religioso no currículo da Escola Normal. Olympio nunca concordou com isto e decidiu fazer desta a sua principal bandeira de lutas. Buscou o mandato pretendendo a revogação da reforma do ensino.

Na passagem da monarquia para a república, em Sergipe, como em todo o país, as lideranças se misturaram nos diversos partidos que, não obstante o ideário que anunciavam, possibilitava o convívio sob a mesma legenda de republicanos “puro sangue” e monarquistas convertidos em “republicanos de ocasião”.

Assim, em Sergipe, eram correligionários no Partido Nacional Fausto Cardoso, Coelho e Campos e Leandro Ribeiro de Siqueira Maciel. O monsenhor Olympio Campos fundou o Partido Católico, em 1890. Além disso, também funcionava em Sergipe o Partido
Democrata.

Na prática, existiam mesmo dois agrupamentos rotulados popularmente de “Pebas” (por terem suas principais lideranças baseadas no eleitorado da capital) e “Cabaús” (pelo fato de suas lideranças receberem o apoio da maior parte dos senhores do açúcar, principalmente na região do Vale do Cotinguiba).

Aos poucos, Olympio Campos se transformou no principal líder dos “Cabaús”, temido e odiado pelos seus adversários. Exerceu o controle do Partido Republicano e derrotou o general Oliveira Valadão, o candidato dos “Pebas”, inaugurando um processo que efervesceu na morte de Fausto Cardoso e culminou com a sua própria morte.

 

 

*Jornalista, doutor em Educação, professor aposentado do Departamento História, do Mestrado em História e do Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. Membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.

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