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IRINEU E A HISTÓRIA DO SOM


  

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

Não lembro desde quando sou amigo de Irineu Fontes. Tenho a impressão de ser desde sempre. Creio tê-lo visto pela primeira vez na TV Sergipe, talvez no programa infantil da Tia Nazaré Carvalho. Disto, não tenho certeza. Sei apenas que as minhas primeiras lembranças são de um adolescente loiro, cantando na TV, no rádio, nos palcos.

Nas minhas primeiras lembranças de Irineu, ele ainda ostentava uma basta cabeleira. Faz tempo. Irineu Fontes, muito jovem e já famoso por ser um bom violonista, bom cantor, bom intérprete, bom compositor. Nos tornamos amigos e aos poucos fui descobrindo o agitador cultural, o produtor de shows, o promoter competente, o diretor de espetáculos.

Sempre acompanhei Irineu trabalhando com gente da melhor qualidade como Jorge Lins, Luiz Eduardo Oliva, Paulo Lobo, Irmão, Tonho Baixinho e tantos outros. Tudo gente que sempre cuidou de fazer boa música em Sergipe. Conheci o Irineu que se revelou um grande gestor público, descoberto pelo também talentoso Luiz Antônio Barreto.

O mesmo Luiz Antônio Barreto que orientou muita gente envolvida com a política cultural em Sergipe. Como Neu Fontes, eu sou um deles. Com Luiz na condição de preceptor, Irineu aprendeu a dirigir teatros, a exemplo da maior casa de espetáculos de Sergipe, o Teatro Tobias Barreto. Irineu Fontes foi também diretor do Teatro Atheneu e do Lourival Baptista. Dirigiu competentemente outras casas de espetáculo como o Espaço Gonzagão.

Conheço o Irineu que trabalhou ao lado de nomes relevantes da gestão cultural em Sergipe, como foi com o próprio Luiz Antônio Barreto, José Carlos Teixeira, Amaral Cavalcante, Luiz Alberto dos Santos, Elber Batalha e João Augusto Gama da Silva. O Neu que foi competente secretário da Cultura no município de Laranjeiras.

O mesmo Irineu Fontes com quem trabalhei durante a gestão do governador Jackson Barreto de Lima. Ele, secretário de estado da Cultura e eu da Educação. A conexão existente entre as nossas áreas de trabalho nos aproximou ainda mais e fez crescer a minha admiração pela sua capacidade de trabalhar inovando permanentemente.

O meu convívio com Neu Fontes se repetiu tempos depois, quando tive a oportunidade de coordenar as celebrações organizadas pelo Poder Legislativo do Estado de Sergipe em homenagem aos 200 anos da emancipação política sergipana. À época, a Assembleia tinha como presidente o deputado Luciano Bispo, Irineu era o diretor de Comunicação Social e o engenheiro Roberto Bispo era o diretor geral do Poder Legislativo.

Agora, Irineu me deixou ainda mais surpreso com as suas competências ao publicar o livro O SOM DA HISTÓRIA. São raros em Sergipe os estudos acerca da História da Música. O trabalho é um presente de Irineu que tem se dedicado a pesquisar e estudar a História da Música Popular em Sergipe.

O ensaista explora um universo pouco conhecido e chama a atenção do leitor para a importante influência de Luís Americano, dos festivais de Música Popular Brasileira, de ícones como Nery e Valdefrê, da alma da guitarra, das vozes femininas, da TV Sergipe, do Pré-Caju e da Ópera do Milho.

O livro de Irineu Fontes é uma agradável surpresa. Não consigo esconder o meu encantamento com o trabalho e tenho certeza de que outros leitores também se encantarão. A edição muito bem cuidada é de responsabilidade da Criação Editora e tem o patrocínio do Instituto Banese, com projeto gráfico e capa de Alex Magron, diagramação de Adilma Menezes e revisão de Antônio Alves de Amaral.

A rica iconografia do trabalho é assinada pelos fotógrafos Joel Luiz, Enaldo Valadares, Fernando Souza, Lineu Lins, César, Jairo e o próprio Neu Fontes, além do xilogravurista Elias Santos. São 247 páginas nas quais, além dos textos de Neu há também um prefácio de Rubens Lisboa e apresentações assinadas por João Augusto Gama da Silva, Isa Trigo e Antônio Alves do Amaral.

Irineu dividiu a exposição textual em 55 artigos que podem ser lidos de modo articulado ou separadamente, com independência, sem que haja prejuízo às ideias expostas pelo escritor. O próprio autor do livro confessa que começou a escrever na década de 80 do século XX, estimulado pelo seu amigo teatrólogo Jorge Lins.

Depois disto informa ter sido estimulado pelo jornalista Jozailto Lima, à época editor do jornal Cinform, que costumava lhe encomendar textos que eram publicados semanalmente. O seu amigo publicitário Manuel Prado Vasconcelos também lhe demandava artigos semanais que eram publicados no site do Instituto Hélvio Dória Maciel Silva.

Por último, Irineu Fontes cita dentre as muitas influências e estímulos que recebeu os nomes do seu amigo empresário Antônio Rollemberg, e dos jornalistas Elenado e Edvan, ambos do jornal Cinform.

Com linguagem direta, quase um bate papo, Irineu comenta no primeiro artigo do livro o processo de produção do show que o fez subir profissionalmente pela primeira vez no palco do Teatro Atheneu. O último texto conta a história da Ópera do Milho. ideia desenvolvida por Luiz Antônio Barreto e por ele, encenada pela primeira vez em 1996.

A estreia de Irineu Fontes como escritor impressiona positivamente. Quem se lança à leitura do livro O SOM DA HISTÓRIA gosta da história dos sonos do autor. Há um único problema: Irineu abriu a Caixa de Pandora e não conseguiu nos saciar. Sabemos que de onde saiu a história dos sons de Irineu há muito mais não revelado. Queremos saber.    

 

 

Jornalista, doutor em Educação, professor aposentado do Departamento de História, do Mestrado em História e do Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. Membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.

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