Jorge
Carvalho do Nascimento
Quem
escreve em jornal é, normalmente, um escritor do dia a dia, do cotidiano. Tem
muita pressa em dizer as coisas, quer ver o resultado e faz com que fique imediatamente
velho aquilo que diz. No caso de Luiz Antônio Barreto, porém, a velocidade do
jornalismo diário não resultou em prejuízo da qualidade das suas reflexões,
sempre atentas ao problema das relações homem-cultura e a interpretação da
cultura brasileira.
Daí
a importância de seus trabalhos não permanecerem dispersos, como sempre foi
próprio ao texto publicado na imprensa diária. Esta, a razão da decisão que
tomei de produzir um estudo biográfico sobre Luiz Antônio Barreto e de
dispender energia em torno da organização e reunião da sua obra, ainda
dispersa.
O
roteiro de alusões culturais de Luiz Antônio Barreto é surpreendente para quem,
como ele, recebeu uma formação inicial periférica em municípios do interior dos
Estados de Sergipe e da Bahia. Lugares como Lagarto, onde nasceu em 1944,
Olindina, Tobias Barreto, Pedrinhas e Maruim – que percorreu ao lado do pai,
João Muniz Barreto, um exator udenista que sempre teve necessidade de mudar-se
com os filhos em face dos problemas da política sergipana nos anos 40, 50 e 60
do século XX.
O
fio condutor da obra de Luiz Antônio Barreto é o modo como ele teoriza a
respeito da organização da sociedade brasileira, especialmente no que concerne
ao conjunto das práticas culturais, demonstrando a coerência de um trabalho no
qual olhou o Brasil e procurou ler, pensar e interpretar.
As
dimensões mais salientes da obra de Luiz Antônio Barreto se apresentam como
Jornalismo, Editoração, Agenciamento Cultural, Folclore, Crítica Literária,
Criação Literária, Sociologia, História, Educação e Música.
Estudar
a obra de Luiz Antônio Barreto, mais do que passar em revista e selecionar uma
série de textos, significa acompanhar de perto as experiências de uma geração
sintetizadas na vida de uma das expressões de maior relevo – o próprio Luiz
Antônio Barreto. A história dos indivíduos é fundamental porque,
invariavelmente, é a história dos seus circunstantes em diferentes momentos e
variados espaços.
Os
indivíduos trazem nas suas cargas pessoais de experiência todo o caldo de
cultura dos grupos sociais nos quais conviveram. A história de vida de Luiz
Antônio Barreto é, também, a história dos seus inúmeros afetos e desafetos.
Saiu
da sua cidade natal, Lagarto, em 1946, dois anos depois de ter nascido. Em
Olindina, onde foi morar, permaneceu durante sete anos, até 1953, quando tinha
nove anos de idade. Dos nove aos 12 anos morou em Tobias Barreto. A partir de
1956 passou a morar em Pedrinhas, de onde mudou-se em 1957 para viver
sucessivamente em Maruim, Santo Amaro das Brotas e Riachuelo, até fixar-se
definitivamente em Aracaju, na metade da década de 60 do século XX.
Estas
foram as andanças do filho de um Exator. Ele acompanhou o pai nas diversas
remoções e transferências e, em alguns casos, até expulsões dos municípios onde
este trabalhava, em face das circunstâncias da política de Sergipe nas décadas
de 40, 50 e 60 da última centúria.
Essas
andanças da infância, adolescência e juventude oportunizaram a vida em um
caldeirão de manifestações culturais populares que marcaram para sempre a alma
de Luiz Antônio Barreto. As experiências de vida acumuladas desde cedo
possibilitaram que nos primeiros anos de atuação como jornalista ele já
dispusesse de um repertório cultural que foi se refinando e enriquecendo com as
múltiplas possibilidades que os novos ambientes que frequentava passaram a lhe
proporcionar.
Reflexão
e ação constituem elementos indissociáveis na história de vida do intelectual
Luiz Antônio Barreto. A sua produção cultural está articulada com as
iniciativas tomadas por ele em todas as instâncias profissionais e políticas
nas quais agiu. O folclorista Bráulio do Nascimento anotou esta característica
do trabalho de LAB ao escrever o texto de apresentação do livro CULTURA: UM
ROTEIRO DE ALUSÕES, assinado por Luiz Antônio em 1994.
“Esta
motiva e impulsiona aquela, que orienta e dimensiona esta, dando-lhe uma
correlação permanente com a realidade, seja na atividade prática, seja na
reflexão dos diversos temas, na pesquisa e na realização de programas comuns
com instituições públicas ou particulares. Essa adequação entre teoria e
prática tem-se revelado uma constante nos diversos cargos públicos” (p. 11) que
LAB ocupou.
Falando
sobre a obra poética de Luiz Antônio, o folclorista Jackson da Silva Lima, ao
prefaciar o citado CULTURA: UM ROTEIRO DE ALUSÕES, chama também a atenção para
a proatividade que tem o autor no processo de articulação entre teoria e
prática. “Entre a publicação do MONÓLOGO (1964) e o inédito ROMANCEIRO DA
GUARDA E DA VIGIA (1971), Luiz Antônio Barreto escreveu o livro MARCHA (1966),
no qual fez profissão de fé da poesia como arma de luta ou de denúncia, como
instrumento de libertação do homem” (p. 17).
Por
isto, no texto introdutório ao livro que homenageou os 50 anos de idade de Luiz
Antônio Barreto, eu busquei me referenciar no impacto que teve a Universidade
de São Paulo – USP na vida intelectual brasileira, considerando aquela
instituição um divisor de águas nos rumos que os intelectuais do Brasil
assumiram.
O
seu êxito como instituição acadêmica forjou um novo modelo de intelectual que
substituiu um entendimento de cultura que foi desaparecendo à medida que o
século XX se esvaiu. Se o novo modelo permitiu que a pesquisa, em todas as
áreas, ganhasse novos rumos, conhecesse novos objetos e assumisse preocupações
que até então estiveram afastadas do debate, criou limitações e estabeleceu uma
certa desarticulação, em algumas áreas do conhecimento das humanidades, que é,
sob certo ponto de vista, limitadora do entendimento de determinados objetos e
problemas.
O
sistema universitário brasileiro, juntamente com a sociedade, cresceu durante o
século XX e agora, no primeiro quartel do século XXI, outra vez as ciências
humanas, ao que parece, estão reaprendendo a articular conhecimentos e objetos
que até então pareciam coisas exclusivas de especialistas.
Foi
neste tipo de solo que Luiz Antônio fez funcionar o seu arado, plantou e
colheu, legando uma obra múltipla, vária, dispersa e que merece catalogação. As
vozes que na transição do século XX ao XXI deram sentido acadêmico ao que fez,
durante toda a vida, o pesquisador LAB, foram as das leituras dos herdeiros da
chamada Escola dos Annales, de origem francesa.
Foram
eles que possibilitaram o amadurecimento acadêmico do debate cultural, pela
contribuição dada a partir dos problemas que levantaram e dos objetos sobre os
quais se debruçaram, tal como fez Luiz Antônio Barreto durante toda a sua vida.
Como eles, LAB também chamou a atenção para a necessidade de uma interpretação
ampla e articulada dos fenômenos da cultura, repondo e reconstruindo objetos
que eram preocupação dos humanistas da sua geração, fortemente enraizados com a
literatura e que a partir dela observavam um caleidoscópio que englobava áreas
tão distintas quanto a história, a antropologia, a sociologia, o folclore, a
filologia, a linguística e outros tantos campos fundamentais à explicação
cultural.
A
especialização das ciências humanas e um certo discurso economicista levaram ao
empobrecimento da compreensão da cultura. Combater tal fenômeno é substrato de
ação e reflexão na obra de Luiz Antônio Barreto. Para ele, além de não ter
conseguido dar respostas a diversos problemas colocados pelas ciências humanas,
essa especialização foi, em boa hora, superada pela Nova História Cultural que
recompôs toda a contribuição dos humanistas que antecederam as especializações.
Durante
toda a sua vida, LAB advogou a necessidade que tinham as instituições
universitárias brasileiras de reler toda a geração de intelectuais pátrios do
século XIX e ficar cada vez mais atenta ao que eles diziam quando interpretavam
o Brasil. Os marcos históricos de interpretação da nossa realidade foram
recolocados a partir do final do século XX, tornando possível descortinar um
novo Brasil, até então ofuscado pelas luzes das interpretações especializadas
que atribuíam ao Rio de Janeiro, a Minas, a Pernambuco, a Bahia, ao Rio Grande
do Sul, ao Amazonas e a São Paulo as mesmas determinações e as mesmas
características no seu processo de formação econômica, social e política: a
dicotomia capital-trabalho, sem perceber que muitas vezes existiam mais especificidades
e contradições que colocavam outros elementos em tal processo.
Em
1959, por já estar escrevendo uma coluna de cinema no jornal Correio de
Aracaju, Luiz Antônio foi convidado a fazer figurações no filme Nordeste
Sangrento, rodado sob a direção do cineasta sergipano Wilson Silva, em Maruim.
Outra
experiência importante de Luiz Antônio Barreto nos primeiros anos de Aracaju
foi a política estudantil. No Colégio Pio Décimo, Luiz Antônio foi candidato a
presidência do Grêmio. Quando se transferiu para o Colégio Tobias Barreto, na
quarta série ginasial, participou ativamente da política estudantil, integrando
a diretoria do Grêmio que era presidido por Luciano Morais, filho do líder
comunista Lídio Santos.
O
próprio Luiz Antônio assumiu a presidência do Grêmio do Colégio Tobias Barreto
em 1962, e em 1963, nessa condição, disputou a presidência da União Sergipana
dos Estudantes Secundaristas – USES, num congresso realizado em Propriá. Sem
estar ligado ao Partido Comunista, que de certa forma hegemonizava naquele
momento o movimento estudantil, Luiz Antônio mantinha uma relação de
proximidade muito grande com o velho PCB.
Esse
bom relacionamento dava ao líder estudantil uma participação ativa e destacada
nos vários movimentos sociais e políticos de Sergipe. Quando o deputado Cleto
Maia foi preso na Paraíba, um dos mais inflamados oradores no comício de
desagravo realizado na praça Fausto Cardoso, quando da sua chegada a Aracaju,
foi Luiz Antônio Barreto.
Era
comum a sua participação, como líder estudantil, nos comícios que o Partido
Comunista e outras organizações de esquerda faziam nos bairros de Aracaju.
Ainda menor de idade participou ativamente da campanha de Jânio Quadros a
presidente da República. Sua militância janista foi inicialmente influenciada pelo
udenismo do seu pai.
Os
sete anos que vivera na Bahia foram motivados por uma razão política: o pai
havia sido preso e deportado, expulso do município de Lagarto, por ser
udenista. Na volta a Sergipe a família continuou refém do udenismo do seu pai,
trabalhando no fisco e sempre removido de um lugar para outro por questões de
ordem política.
Mesmo
no governo udenista de Luiz Garcia seu pai continuou a ser perseguido. “Meu pai
era udenista, mas era um homem sério, cobrava imposto dos dois lados. Alguns
próceres da UDN não admitiam que ele cobrasse imposto dos udenistas” –
costumava comentar Luiz Antônio sobre este assunto.
As
experiências de vida levaram Luiz Antônio a realizar alguns sonhos e sepultar
outros, mudando a trajetória de vida e fixando novos caminhos ao intelectual. O
projeto de estudar Medicina foi substituído pelo exame vestibular para o curso
de Direito, já que à época, trabalhando na Campanha Nacional de Educandários
Gratuitos – CNEG, não tinha condições de permanecer durante todo o dia no
hospital frequentando o curso de Medicina.
Na
Faculdade de Direito as aulas funcionavam normalmente das sete às 10 da manhã.
Sergipe perdeu o médico e não chegou a ganhar o advogado, porque Luiz Antônio
Barreto abandonou a carreira depois de ter exercido a advocacia num escritório
que montou no Rio de Janeiro em sociedade com o lagartense Ernani Romero
Libório.
A
Cultura foi para Luiz Antônio uma opção que se pôs à medida que se aprofundaram
as perseguições que sofreu durante os governos da ditadura militar. Após a sua
prisão, em 1964, as perspectivas de vida se estreitaram cada vez mais. Aprovado
em concurso para o Banco do Brasil, teve sua nomeação impedida pelos órgãos de
informação militares, que também lhe cassaram o registro de professor de
ciências, impedindo que continuasse a trabalhar no Ginásio de Itaporanga
D’Ajuda.
A
via cultural se colocou como possível a quem não era comunista e sempre
confessara ter muito mais afinidade com as teses de Bakunin e de Kropotkin que
com o Marxismo. As dificuldades financeiras provocadas pelas frequentes
demissões dos lugares nos quais trabalhava faziam com que Luiz Antônio Barreto
fosse obrigado a usar a imaginação para buscar meios que viabilizassem a
profissionalização do seu fazer intelectual.
Exemplo
disso é a ideia que teve, em 1974, de montar uma empresa prestadora de
serviços, o Laboratório Cultural, aproveitando as iniciais do seu nome – LAB. A
partir daí começou a escrever discursos políticos, atividade que se ampliou com
a criação do Pesquise – Pesquisas de Sergipe, não só escrevendo discursos
políticos, mas também produzindo textos, assessoramento e consultoria na área
cultural.
O
Pesquise foi um projeto que se tornou vitorioso e, a partir de 1984, foi a
principal atividade profissional de Luiz Antônio, estrutura que lhe
possibilitou dar uma considerável contribuição aos estudos sobre cultura em
Sergipe e no Brasil.
Além
das dificuldades que lhes foram impostas pelo regime da ditadura militar, ao
longo da sua vida Luiz Antônio também viveu umas outras tantas que foram postas
em função do seu temperamento pessoal e do entendimento que tinha da ação
cultural. Um episódio que retrata bem esse tipo de problema é o da sua saída da
chefia da Assessoria Cultural da Secretaria da Educação e Cultura do Estado de
Sergipe, em 1978.
Este
era um assunto a respeito do qual Luiz Antônio não gostava de fazer
referências. A sua saída da Assessoria Cultural se deu pela sua discordância da
posição do secretário da Educação e Cultura, Everaldo Aragão Prado, que para
atender ao arcebispo Luciano Duarte autorizou a transferência de Laranjeiras
para São Cristóvão das peças sacras, sob a alegação de que em Laranjeiras não
havia segurança pois estavam acontecendo muitos roubos de imagens.
Apesar
da admiração e respeito que tinha e continuou a ter enquanto viveu pela pessoa
de Everaldo Aragão Prado, Luiz Antônio, ironicamente, sugeriu que colocassem as
imagens logo dentro do quartel da Polícia Militar por ser esta uma maneira de
preservá-las melhor ao invés de levá-las para o Museu de Arte Sacra, em São
Cristóvão, e descaracterizar a tradição cultural laranjeirense.
Esse
foi um episódio importante, porque com a saída de Luiz Antônio da Assessoria
Cultural, Laranjeiras ganhou um Núcleo de Arte Sacra que foi instalado dentro
da Igreja de Nossa Senhora da Conceição dos Pardos.
Se
a ação cultural proporcionou a Luiz Antônio vários momentos de angústia, é
óbvio que também criou situações muito gratificantes, principalmente aquelas
nas quais recebia o reconhecimento do seu trabalho intelectual, como em 1979,
quando entrou na Academia Sergipana de Letras.
Mesmo
tendo assumido várias funções públicas ao longo da sua vida, nunca houve um
afastamento da militância cultural e na análise da sua produção é possível
perceber uma evolução e continuidade permanentes. Uma coerência consigo
próprio, de quem ao longo da vida fez apenas três coisas: trabalhar como jornalista
e escritor, em atividades culturais e em educação.
A
coerência da ação cultural permitiu que, desde muito jovem, ao longo dessa
trajetória, Luiz Antônio estabelecesse muitos relacionamentos intelectuais.
Luiz atuou no Grupo Novo de Sergipe, um contato de jovens com a Literatura e a
Cultura sergipana – passando pela Galeria de Arte Álvaro Santos, pelo Instituto
Nacional do Livro, pela Organização Simões Editora, no Rio de Janeiro, pela
Universidade Federal de Sergipe, pela Secretaria Municipal de Educação de
Aracaju, pela Fundação Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais, pelo
Serviço Social da Indústria – SESI, pela Confederação Nacional da Indústria -
CNI, pela Secretaria de Estado da Cultura e pela Secretaria de Estado da
Educação de Sergipe.
Foram
muitos os contatos estabelecidos com a intelectualidade brasileira sempre em
torno da cultura, especialmente da Literatura e do Folclore. Foi profundo o seu
diálogo com instituições universitárias brasileiras, a começar pela
Universidade Federal de Sergipe, passando pela Universidade Estadual de
Londrina – UEL, no Estado do Paraná, pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro – UFRJ, pela Universidade Federal da Bahia, pela Universidade Federal
de Ouro Preto e pela Universidade Federal de Minas Gerais, ambas no mesmo
Estado, e pela Universidade Federal de Pernambuco.
Em
Sergipe vale destacar também o seu profundo relacionamento com a Universidade
Tiradentes. Importante ainda o registro das relações que manteve com
Universidades de outros países, como a Universidade Nova de Lisboa, em
Portugal, e a Universidade de Milão, na Itália.
Dentre
todas as ligações intelectuais de Luiz Antônio Barreto, quatro merecem registro
especial: Paulo Mercadante, Antônio Paim, Miguel Reale e Gilberto Freyre. Todos
eles mantiveram permanente diálogo e troca de ideias com o intelectual
sergipano. Com eles, Luiz Antônio manteve produtivas parcerias de trabalho.
Paulo
Mercadante e Antônio Paim eram, em 1968, os organizadores da obra completa de
Tobias Barreto, dando um lustro de atualidade ao plano inicial de Sílvio
Romero, que Manoel dos Passos de Oliveira Teles e João Barreto Menezes haviam
executado em 1926.
O
contato que Luiz Antônio travou, em 1968, com Paulo Mercadante e Antônio Paim
foi estabelecido em função do interesse que havia em reeditar a obra completa
de Tobias Barreto. Nos anos 70 o contato ficou enfraquecido, depois da volta de
Luiz Antônio a Sergipe, mas a aproximação do centenário de Tobias fez com que o
contato fosse retomado, nos anos 80.
Com
a realização de novos contatos, Luiz Antônio gestionou junto ao governador de
Sergipe, Antônio Carlos Valadares, no sentido de que este solicitasse ao
presidente da República, José Sarney – desde aquela época ocupante da cadeira
que tinha como patrono Tobias Barreto, na Academia Brasileira de Letras – o financiamento
da reedição da obra.
Idênticas
gestões foram feitas junto aos senadores Francisco Rollemberg e Albano Franco –
estes fizeram discursos no Senado, solicitando a reedição como sendo a melhor
homenagem que o Brasil poderia prestar a Tobias Barreto no centenário da sua
morte.
O
reatamento dos contatos levou Luiz Antônio, Paulo Mercadante e Antônio Paim a
integrarem o Instituto Brasileiro de Filosofia Luso-Brasileira em Portugal, o
Instituto de Filosofia de Londrina, o Centro de Documentação do Pensamento
Brasileiro, na Bahia, o Instituto Brasileiro de Filosofia, em São Paulo, e a
participarem da organização dos Colóquios Tobias Barreto, em Portugal, e Antero
de Quental, no Brasil, e dos seminários de estudos e pesquisa em Filosofia
brasileira.
Toda
essa movimentação aproximou Luiz Antônio Barreto de Miguel Reale,
principalmente na organização dos eventos sobre o pensamento de Tobias Barreto
realizados em Portugal. Outros nomes que gravitaram em torno desse circuito de
relações foram os do professor Tiago Adão Lara, em Minas Gerais; Rosa Mendonça
de Brito, no Amazonas; Roque Spencer Maciel de Barros, em São Paulo; Leonardo
Prota, em Londrina; Aquiles Cortes Guimarães, no Rio de Janeiro; e Nelson
Saldanha, na Universidade Federal de Pernambuco.
O
grupo incluía também a figura de Vamireh Chacon, com quem Luiz Antônio
mantivera muitos contatos anteriormente, no Rio de Janeiro, em 1969, quando
editou pela Organização Simões, que dirigia, o livro de Vamireh, Da Escola do
Recife ao Código Civil.
Luiz
Antônio passou a vida pensando e escrevendo. Foram 53 anos de produtiva
produção intelectual e 68 de vida, até a sua morte em 2012. Tenho catalogados
mais de 500 artigos de sua autoria publicados em jornais, revistas, anais de
eventos e livros de coletânea. Sei que existe muito mais disperso em
publicações de Sergipe, de Pernambuco, da Bahia, de Alagoas, Paraíba, do Rio de
Janeiro e de São Paulo, além do que circulou no exterior, principalmente em
Portugal. Sem falar em 32 livros dos quais ele é autor.
É
ao mesmo tempo fácil e, também muito difícil ler e selecionar textos de Luiz
Antônio Barreto. Fácil pelo domínio que ele possuía da produção textual. Ele
era um mestre da escrita. Sabia amalgamar palavras, amaciar substantivos,
adjetivos e verbos como poucas pessoas são capazes de fazê-lo.
Difícil
porque Luiz Antônio possuía uma erudição que fazia do seu discurso algo
profundo e nem sempre acessível aos não iniciados em determinados temas. Ler o
autor é passear com ele pela cultura sergipana, sempre bem-posicionada no
contexto da cultura brasileira,
A
leitura dos trabalhos de Luiz Antônio ajuda a entender Sergipe e o Brasil nos
séculos XIX e XX. Quem quiser um bom roteiro de estudos sobre a História da
Imprensa em Sergipe, por exemplo, pode se debruçar sobre os artigos de Luiz
Antônio acerca do tema. Terá não apenas um painel profundo e completo, mas
também um guia de estudos que esclarecerá quanto aos autores a buscar e os
arquivos a conhecer. Também, a partir do seu trabalho é possível entender o
mercado editorial brasileiro.
Ele
é fonte indispensável em Sergipe acerca da importância da geração que se viu
obrigada a ressuscitar sem morrer – porque atingida em cheio pelo golpe militar
de 1964. A geração que viveu os seus dramas e buscou na cultura construir um
caminho de alternativa social para escapar das armadilhas que estavam montadas
nas vielas da vida.
O
trabalho do folclorista Luiz Antônio Barreto faz com que entendamos os
diferentes processos de produção da vida, do trabalho e do lazer numa sociedade
estratificada em classes distanciadas pela apropriação do produto social. O
crítico literário nos chama a atenção – principalmente em um dos seus primeiros
dentre os muitos artigos que produziu a respeito do assunto.
A
Revolução da Literatura Brasileira é um artigo que destaca a importância dos intelectuais
brasileiros da segunda metade do século XIX e de como estes colocaram problemas
que influenciam até agora o efervescente ambiente literário brasileiro. Mas,
não é só isso.
Algo
que surpreende muito em Luiz Antônio é que camuflado sob o crítico literário
sempre existiu um talentosíssimo escritor e poeta, que manejou com maestria os
instrumentos de tratos da língua, seja do ponto de vista da capacidade de criar
que possuem os que se valem da tradição oral – como os cantadores populares –
seja da posição dos que exercem controle sobre o refinamento estilístico. Tal
capacidade está demonstrada com toda clareza na Via Sacra que Luiz escreveu
para violeiros, em 1971, e no Romanceiro da Guarda e da Vigia, em cinco cantos.
O
sociólogo, historiador, pedagogo e músico são outras facetas desse raríssimo
personagem que conviveu conosco e nem sempre nós conseguimos perceber enquanto
ele aqui esteve. Na verdade, todos nós tendemos a considerar natural o convívio
com aqueles que integram o dia a dia da nossa paisagem e nem sempre nos damos
conta do que eles são capazes.
Mesmo
quando estivemos, durante muitos anos, ombreados com Luiz Antônio Barreto.
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