Jorge
Carvalho do Nascimento*
Sou
leitor habitual dos artigos que José Rollemberg Leite Neto publica no jornal
Correio de Sergipe. Os textos são atraentes pela linguagem direta e objetiva.
As frases curtas que vão ao que é fundamental na questão tratada são marcas que
distinguem o seu estilo como autor que sabe seduzir os que se lançam à leitura.
Mas,
o melhor da escrita de Rollemberg é o fato de que discutindo Direito ele faz um
passeio pelos estudos de História, visita a Sociologia, a Ciência Política e a
Antropologia com a segurança que é dada aos que se dicam a fazê-lo com
seriedade, responsabilidade, muita pesquisa e respeito ao leitor.
Sim,
José Rollemberg Leite é erudito, avis rara desde sempre entre os
operadores do Direito. O campo jurídico é pródigo em autores que abusam de
frases feitas em Latim. Feitas para efeito, mas esvaziadas de conteúdo e
sentido. Encontrar profissionais do Direito que tratam os seus temas com
objetividade e poupam o cérebro de quem lê do latinismo rococó, é tudo de bom.
Faço
tal preâmbulo para afirmar que gostei de ler URNAS & LEIS: DA PRIMEIRA
ELEIÇÃO AO PRIMEIRO CÓDIGO ELEITORAL. CRÔNICA ELEITORAL BRASILEIRA. 1532-1932.
O livro, assinado por José Rollemberg Leite Neto e publicado pela Tagore
Editora reúne 31 artigos de sua autoria que circularam em versão primeva no
jornal Correio de Sergipe.
Como
sempre, cuidadoso com aquilo que publica, Rollemberg convidou o importante
advogado Eduardo Ferrão para escrever o texto de apresentação do seu trabalho e
entregou ao presidente do Instituto Brasileiro do Direito Eleitoral, Marcelo
Ribeiro, a responsabilidade de assinar o Prefácio.
Não
tenho nenhuma dúvida do domínio teórico que possui José Rollemberg Leite Neto
ao manejar as ferramentas da pesquisa histórica e a competência que demonstra
ao expor os resultados daquilo que investiga. Mesmo quando não se propõe a
nenhum aprofundamento analítico.
Esta
sua característica é notável logo no primeiro dos artigos publicados nesta
edição, aquele que trata das primeiras eleições realizadas em solo brasileiro,
ainda no período do Brasil Colônia, em 1532. No texto, o autor apresenta as
regras eleitorais vigorantes nos códigos das Ordenações Manuelinas e Filipinas.
A
capacidade que revela José Rollemberg Leite Neto para identificar contextos nos
quais estão inseridos os fenômenos que analisa é eloquente no artigo A
Revolução e a Eleição. Ali, ao nos apresentar ao processo eleitoral de 1821 que
escolheu 72 deputados que iriam a Lisboa como representantes do Brasil para,
juntamente com outros deputados do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, elaborar
a nova Constituição, ele contextualiza questões como a invasão napoleônica, o
Iluminismo Europeu e outros problemas oitocentistas.
Metaforicamente
é possível afirmar que em seus estudos Rolemberg Leite segue uma espécie de “fio
de Ariadne” para deslindar a história das eleições no Brasil, principalmente no
século XIX. Ali põe ênfase na primeira lei eleitoral brasileira que regrou a
escolha dos primeiros deputados provinciais brasileiros.
A
ironia é outra marca da escrita de José Rollemberg Leite Neto. Esta se revela
por inteiro no texto Párocos, Fósforos e Fogos que discute a dificuldade que
tem a elite brasileira de aceitar os resultados eleitorais quando estes lhes
são adversos, recorrendo a todo tipo de artifício para anular a manifestação
dos eleitores nas urnas. Colocar defeito em urna e recusar os seus resultados
não é novidade do século XXI. Já era prática corrente no século XIX.
Um
outro fenômeno do tempo presente – a radicalização e a intolerância entre
grupos politicamente opostos da vida brasileira, segundo Rollemberg Leite, também
não é coisa que surgiu no século XXI. Mesmo antes do advento dos partidos
políticos com personalidade jurídica, a prática da intolerância política era
corrente como nos diz o texto Polarização Ancestral.
Do
mesmo modo, também não é novidade na vida política brasileira a metamorfose dos
partidos políticos que vão o tempo inteiro se transformando em caricaturas de
si. No Primeiro Reinado, a cena da política brasileira era dominada pelo
Partido Português ao qual se contrapunha o Partido Brasileiro. Todavia, as duas
agremiações se transformaram nos partidos Restaurador, Liberal Exaltado e
Liberal Moderado.
A
riqueza do trabalho escrito por José Rollemberg Leite desautoriza o excesso de
modéstia do autor que em diversos momentos do texto se desculpa diante do leitor
por não haver aprofundado um ou outro aspecto nos estudos que realizou. Mas,
este comportamento marcado pela modéstia é um traço da sua personalidade, muito
rigorosa nas cobranças que faz a si.
Felizmente,
o posfácio do professor Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, da Universidade de São
Paulo, recoloca o nosso autor na posição que lhe cabe: a de um operador do
Direito erudito, de um intelectual esmerado que com suas ideias e a defesa que
faz da democracia no Brasil ainda tem muito a contribuir. A leitura do seu trabalho nos enriquece e faz
com que reafirmemos o nosso compromisso com o Estado democrático.
*Jornalista, doutor em Educação, professor aposentado do Departamento de História, do Mestrado em História e do Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. Membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
Comentários
Postar um comentário