Jorge
Carvalho do Nascimento*
A
Educação brasileira encerra o mês de agosto celebrando a entrada em vigor da
Emenda Constitucional 108, promulgada quarta-feira última, que tornou
permanente o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb.
O
novo Fundeb, além do caráter permanente que recebeu também teve o seu alcance
ampliado, o que o faz ainda mais importante do que aquilo que já foi até agora.
Não obstante o papel que vem cumprindo e que continuará a cumprir na nossa política
educacional, para a maior parte dos cidadãos é difícil compreender o conteúdo que
há por trás do seu rótulo.
O
Fundeb sucedeu o Fundef – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério, implantado a partir de 1997,
durante a gestão do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Com o Fundef, foi
possível dar ossatura a uma rede de escolas municipais, da qual o Brasil
carecia.
O
Fundef foi transformado em Fundeb no ano de 2007, sob o governo do Presidente
Luiz Inácio Lula da Silva. A ampliação disponibilizou uma maior quantidade de
recursos e corrigiu uma distorção inicial do Fundef ao permitir a cobertura de
toda a Educação Básica, garantindo investimentos no Ensino Médio e na Educação
Infantil, o que antes não era permitido.
Se
o Fundef ajudou a universalizar a matrícula do Ensino Fundamental, o Fundeb criou
os meios para uma significativa ampliação da cobertura do Ensino Médio e também
da Educação Infantil, embora ainda haja necessidade da universalização desses
dois segmentos da Educação Básica e de elevação da sua qualidade.
Para
dar consistência a esta conversa, é necessário desfazer algumas confusões nas
quais até profissionais do ensino incorrem frequentemente. Muitas pessoas
acreditam que o Fundeb é um Fundo formado por uma dinheirama derramada pelo
Tesouro Nacional sobre a Educação brasileira. Ledo engano. A União, o ente que
fica com a maior parte das receitas tributárias arrecadadas no país é
responsável por apenas 10 por cento do montante total, enquanto Estados e
Municípios assumem 90 por cento dessa carga.
O
Fundeb resulta predominantemente das receitas tributárias de Estados e
Municípios. Para facilitar o raciocínio, é como se existissem no país 27 Fundos
que correspondem a cada um dos 26 Estados e ao Distrito Federal. Em cada Estado
há uma conta no Banco do Brasil na qual são depositados 20 por cento das
receitas tributárias citadas, e das transferências compulsórias referentes aos
tesouros municipais e estadual.
Os
valores depositados formam um bolo que é dividido pelo número total de alunos
matriculados nas escolas públicas estaduais e municipais. Há algumas variáveis
consideradas, das quais não vou tratar aqui, apenas para manter o efeito
didático desta conversa. Assim, quanto maior for a matrícula no município,
maior será a quantidade de recursos que tal ente receberá. O Estado e os municípios
que arrecadam mais, normalmente retiram uma quantidade de recursos menor que o
volume de recursos que depositam.
Esta
equação faz do Fundeb uma ferramenta democrática de redistribuição financeira e
redução das desigualdades educacionais dentro do território do Estado. Se o
Fundeb não existisse, seria normal que a Prefeitura de Aracaju gastasse, por
exemplo, cerca de 11 mil reais anualmente por aluno matriculado, enquanto Ilha
das Flores dispusesse de um orçamento inferior a menos de 1.000 reais por cada
um dos seus alunos.
É
exatamente o Fundeb, através do seu sistema de redistribuição, que permite
fazer com que se eleve o valor gasto por aluno em Ilha das Flores, usando parte
dos recursos depositados pelo Tesouro Estadual, por Aracaju e por outros
municípios com orçamento mais robusto.
No
outro polo do problema, permite também que os salários dos professores do
Estado e de cada um dos seus municípios mantenham um certo equilíbrio, evitando
grandes disparidades. Vários estudos apontam que se o Fundeb não existisse, em
mais da metade dos nossos municípios a remuneração dos docentes não chegaria
sequer a um salário mínimo por mês.
Há
um outro aspecto importante. Os valores totais dos 27 Fundos existentes (um em
cada Estado e mais o Distrito Federal) são somados e se chega a um valor global
daquilo que seria o Fundeb Brasil. O Tesouro Nacional aporta uma contribuição
ao Fundeb que correspondeu até agora a 10 por cento do valor total do Fundo no
país.
Os
recursos aportados pela União se destinam a complementar o valor do Fundo nos
Estados onde os recursos disponíveis, quando divididos pelo total de alunos
matriculados, não permite que seja aplicado por aluno ao menos o custo aluno
que é estabelecido a cada ano. Para 2020, tal custo gravita em torno de 3.600
reais em 12 meses somados.
Isto
é importantíssimo, mas no modo como foi operado até agora produz distorções.
Para que se tenha ideia, na região Nordeste dois Estados não recebem
complementação federal: Sergipe e o Rio Grande do Norte. Assim, ocorrem
discrepâncias gritantes. Um Estado como a Bahia, por exemplo, com 417 municípios,
recebe complementação federal ao seu Fundeb. Todavia, está na Bahia, o terceiro
maior município brasileiro, em população. A cidade de Salvador, capital baiana,
é um município grande, próspero e rico.
Pelo
sistema que vigorou até agora, os alunos da escola pública de Salvador são
beneficiados com complementação federal, enquanto municípios muito pobres de
Sergipe como Indiaroba, Cumbe, Ilha das Flores, Brejo Grande, Telha e Macambira,
dentre outros não recebem nenhum tipo de complementação federal.
O
novo Fundeb se propõe a corrigir esse tipo de distorção. A complementação
federal que atualmente corresponde a 10 por cento do valor total de recursos do
Fundeb chegará a 23 por cento até o ano de 2026. Será uma elevação gradual a
cada ano, começando já em 2021. Com isto, mais da metade dos municípios do
Estado de Sergipe poderá contar com recursos da complementação federal, uma vez
que os valores que serão acrescidos anualmente aos 10 por cento que foram
aportados até agora, considerarão novos critérios para beneficiar diretamente
os municípios mais pobres.
Este
é apenas um aspecto positivo do novo Fundeb. Outros existem. Com gestão eficaz
poderemos melhorar muito a qualidade da Educação Básica que é oferecida ao estudante
brasileiro.
Voltaremos
ao assunto.
*Jornalista,
professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e
presidente da Academia Sergipana de Educação.
Muito clara essa explicação. Importantíssimo termos ciência do que é o “novo Fundeb”.
ResponderExcluirExcelente meu irmão. Paz e Luz!
ResponderExcluir