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Mostrando postagens de junho, 2022

A IGREJA E OS PADRINHOS

      Jorge Carvalho do Nascimento*     De família católica, fui batizado por Joel, pouco tempo depois do meu nascimento. Meu padrinho e meu pai eram amigos íntimos e fraternos. Todavia, após receber o sacramento da crisma é que compreendi efetivamente a força que tinham os padrinhos católicos até a metade do século XX. Ainda criança, numa Sexta-Feira da Paixão, logo após ser crismado, recebi dos meus pais a ordem que era compatível com o padrão cultural reinante à época. Nunca esqueci das palavras peremptórias do meu pai: “Vá até a residência do seu padrinho Maximiliano e, de joelhos, tome a benção dele pela passagem da sexta-feira santa”. O Cânone 849 do Código de Direito Canônico apresenta o batismo como “porta dos sacramentos, necessário na realidade ou ao menos em desejo para a salvação, e pelo qual os homens se libertam do pecado, se regeneram tornando-se filhos de Deus e se incorporam à Igreja, configurados com Cristo mediante caráter indelével”. O batismo apaga a

MORANDO EM MINAS GERAIS NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX

                                                     Ney Carvalho     Jorge Carvalho do Nascimento*     Um depoimento da mineira Ney Carvalho é revelador da infraestrutura e dos hábitos existentes nas casas em que viviam os colaboradores mais graduados da Companhia Vale do Rio Doce - CVRD, construídas em várias cidades mineiras e capixabas ao longo da Estrada de Ferro Vitória-Minas. Ney morou em algumas casas pertencentes a Companhia Vale do Rio Doce, em cidades do Estado de Minas Gerais. Seu Pai, Ozéias Carvalho, era guarda-chaves da CVRD. A empresa costumava construir as casas dos funcionários graduados de cada cidade, como o chefe da estação e o guarda-chaves, sempre nas proximidades da Estação local e acompanhando o traçado da linha do trem que, invariavelmente, corria em paralelo às margens do Rio Doce. A Companhia manifestava com muita clareza a sua preocupação em oferecer boas condições de moradia aos seus colaboradores, principalmente os guarda-chaves, essenciais ao bom funcio

CALAZANS, O GLOBE-TROTTER

      Jorge Carvalho do Nascimento*     Dentre os jovens que migraram da região de Macambira, à época parte do município de Campo do Brito, no Agreste do Estado de Sergipe, no início do século XX, buscando trabalho e melhores condições de vida em outros lugares, um deles especialmente chama a minha atenção: José Calazans de Carvalho. Nascido em 1898, Calazans, aos 16 anos de idade, em 1914, emigrou de Macambira, em Sergipe, para o Estado do Amazonas, a fim de trabalhar no Ciclo da Borracha. Aproveitou a dinâmica da economia do Ciclo da Borracha. Mas, não foi como seringueiro que Calazans foi trabalhar no Amazonas. Jovem, letrado, muito interessados em Literatura, escrevendo bem, utilizando corretamente as regras gramaticais, com uma caligrafia muito aperfeiçoada, o que era valorizado à época, Calazans foi trabalhar no Ciclo da Borracha como missivista. Ganhou um bom dinheiro atendendo aos garimpeiros que migraram de diferentes regiões do Brasil para a Amazônia, escrevendo

O GUARDA-CHAVES

      Jorge Carvalho do Nascimento*     O sergipano Ozéias Carvalho, um dos jovens que migrou em 1926 para trabalhar na obra da Estrada de Ferro Vitória-Minas, residia na cidade de Coronel Fabriciano quando nasceu a sua primeira filha, Nei Carvalho. Ozéias e sua mulher, Zita Mônica de Jesus Carvalho, estavam ansiosos pelo nascimento da criança, depois de alguns de casados. O parto não foi fácil. A menina nasceu prematura, numa gestação de apenas sete meses. O parto, no dia seis de novembro de 1938, foi feito em casa e com a tecnologia à época existente a menina teve necessidade de ser aconchegada com algodão e colocada em uma caixa de sapatos para se aquecer. A menina mineira passou a maior parte da sua vida no Estado do Espírito Santo e aos 83 anos de idade vive na cidade de Vila Velha, embora tivesse apregoado durante muito tempo que jamais moraria no Estado vizinho. Constituiu família e teve cinco filhos, quatro netas e dois netos, todos capixabas. O seu pai, o ferrovi

AS FLECHAS DE ANA MEDINA

      Jorge Carvalho do Nascimento*     Num texto acerca da dificuldade que é a escolha de objetos de estudo, o historiador francês Dominique Julia afirmou a importância de ser capaz de fazer flecha com qualquer madeira. A afirmação do final do século XX era indicativa para os que pesquisam e escrevem a história de que tudo aquilo que envolve a vida é relevante, desde que saibamos como tratar cada objeto. Trago para a literatura a afirmação de Julia e lanço o meu olhar de leitor sobre o talento da escritora Ana Maria Fonseca Medina, detentora de uma ilimitada competência e capacidade de apanhar tudo que passa diante dos seus olhos e transformar em literatura da mais alta qualidade. A autora chamou efetivamente a minha atenção ao publicar, em 1999, o ensaio PONTE DO IMPERADOR. Apanhou o conhecido monumento da cidade de Aracaju, o transformou em objeto de referência memorialística, mas acima de tudo produziu uma narrativa literária sensível, cativante, fluida e profunda.

SILVINO, OZÉIAS E A FERROVIA VITÓRIA-MINAS

                                                              Ozéias Carvalho       Jorge Carvalho do Nascimento*     No ano de 1926, de uma única vez, cerca de 15 jovens sergipanos de Itabaiana-Campo do Brito-Macambira deixaram suas casas e migraram para o Estado de Minas Gerais. Foram trabalhar na região que é atualmente o chamado Vale do Aço, especificamente nos municípios hoje denominados Coronel Fabriciano e Antônio Dias. Alguns atuaram em Teófilo Otoni e outros também em Resplendor. A migração, como se sabe, foi organizada pelo empreiteiro Silvino Pereira, um coronel da Guarda Nacional nascido em Itabaiana, no Estado de Sergipe, em 1895. Ele firmara um contrato destinado a construir a Estação Ferroviária de Calado, atualmente Coronel Fabriciano, e parte da Estrada de Ferro Vitória-Minas naquele trecho. Ainda em funcionamento, a Estrada de Ferro-Vitória Minas teve sua construção iniciada no final do século XIX para transportar passageiros e escoar a produção cafeeira do Vale do Ri