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PARA ONDE VAI A COLUNA SOCIAL? VI

                                                    José Anderson Nascimento


 

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

Durante todo o ano de 1962, a coluna social de Maria Luzia fez sucesso na Gazeta de Sergipe. No início de 1963, a colunista desapareceu das páginas do periódico que passou quase todo o ano de 1963, novamente, sem coluna social. Maria Luiza foi fazer crônica social no rádio, inovando na Rádio Cultura de Sergipe. Um novo colunista social apareceu na edição do dia 03 de dezembro daquele ano, na Gazeta de Sergipe: José Anderson Nascimento.

Ao estrear com a coluna Background, Anderson Nascimento tinha somente 19 anos de idade e chocou a sociedade por fazer um colunismo social diferente de tudo que já se vira até então. Era uma aposta ousada que Orlando Dantas fazia, posto que o colunismo social de Anderson era sui generis.

A começar pelo perfil do colunista. Anderson Nascimento era um militante de esquerda, ligado ao movimento estudantil secundarista, fazendo política ao lado de Alceu Monteiro, Wellington Mangueira, Mário Jorge Vieira e Abelardo Santos, dentre outros. O colunista não se preocupava com detalhes que até eram comuns ao gênero jornalístico como o tipo de vestido ou as joias que uma determinada madame ou a filha de um capitão de indústria estava usando na festa. Todavia não deixava de fazer os registros dos nomes influentes presentes aos eventos que citava.

Mas isto não o impedia de ironizar os grupos sociais e as pessoas com os quais não simpatizava ideologicamente, como o fez já na coluna de estreia. “Todos vocês conhecem aqueles cidadãos ilustres que são habitués da Sorveteria Chic e da porta da Livraria Regina, não? Naquele local são resolvidos todos os problemas políticos internacionais, nacionais e locais. Porém, quem conseguir uma gota de suor de um daqueles ilustres homens, será o maior felizardo da humanidade”.

Da mesma forma, a coluna abria espaços para fazer registros e comentários sobre a atividade política e também produzir críticas a autoridades. Era um estilo novo de fazer coluna social que chegava a Sergipe. Estilo que começava a ser ensaiado por alguns colunistas na mídia do Rio de Janeiro e também em São Paulo.

O estilo se tornou marcante na década de 70 do século XX, no Rio de Janeiro, com o colunista Zózimo Barroso do Amaral, do Jornal do Brasil, que soube mesclar as tradições da coluna social com formas editoriais mais contemporâneas do jornalismo. Em Sergipe, tal estilo foi muito cultivado nas décadas de 70 e 80 do século XX por colunistas como Luiz Adelmo Soares e Osmário Santos.

A coluna Background foi publicada apenas durante quatro meses. No dia 7 de abril de 1964, uma semana depois do golpe militar Anderson foi preso, com outros militantes de esquerda, e recolhido ao quartel do 28 BC, sob a acusação de envolvimento com grupos esquerdistas e com atividades subversivas. Os veículos de comunicação foram colocados sob censura prévia e a coluna deixou de circular.

No dia primeiro de setembro de 1964, a coluna social voltou às páginas da Gazeta de Sergipe, com Luiz Carlos. A coluna Vida nos Clubes devolveu ao periódico a tradição da coluna social, com o registro exclusivo dos chamados pelo gênero de ricos e bem nascidos. Nos seus registros sempre era possível ler notas de referência a autoridades. “Prestigiando com suas presenças estiveram o Governador Celso de Carvalho e sua esposa D. Bertilde Carvalho”.

A coluna foi publicada pela última vez no dia 28 de fevereiro de 1965, ao final das festas carnavalescas daquele ano. “Na noite de ontem a alegria animou os nossos principais clubes, onde todos estiveram animados e a folia pegou por completo. A Atlética, bem como o Iate, estavam lotados, cercados de alegria e foliões”.

A Gazeta de Sergipe estreou uma nova coluna social em 31 de julho de 1965, assinada por R. C. de Souza: Gazeta Social. A colunista demonstrou erudição, aliada ao estilo tradicional do gênero, porém carregada de lirismo, já no primeiro texto publicado. “São três letras e formam uma palavra só. Três letras irretratáveis, imensas/definitivas. Daquelas que veem e que ficam e não passam jamais. (...) AMO”. Ao final de cada coluna sempre se despedia com uma saudação em francês. Au revoir.

R. C. de Souza assinou a coluna durante 10 meses. No dia 25 de dezembro daquele mesmo ano, em uma nota elegante, ela anunciou o seu afastamento e a presença de um novo titular. “A partir da nossa edição de quarta-feira a coluna social da Gazeta de Sergipe será escrita pelo jovem bancário Luiz Adelmo Soares, pessoa que, melhor que a colunista atual, preencherá os requisitos de outra verdadeira crônica social em nossa imprensa. O Luiz Adelmo estudou teatro em S. Paulo, é um jovem culto e inteligente com quem todos vocês ficarão satisfeitos”.

Assinou a coluna pela última vez no dia 28 de dezembro e desfez um mistério ao revelar a verdadeira identidade de R. C. de Souza, na sua “Carta Aberta aos Leitores da Gazeta”. A carta é longa, mas o seu conteúdo justifica a transcrição completa, pelo panorama que oferece não apenas da coluna, mas também do funcionamento daquele que era o mais importante veículo da mídia impressa em Sergipe.

“Prezados leitores da Gazeta de Sergipe: Hoje deixo a redação deste jornal e a vida jornalística em geral para me dedicar a profissão que abracei. Com pesar o faço, e não o faria não fossem as injunções da vida.

Mas nesta hora, em que estou triste, tenho uma grande alegria que é recordar a benevolência com que todos vocês aceitaram as crônicas de uma mocinha canhestra e inadaptada ao ofício. Deixo a todos um pedido: continuem a dar o mesmo carinho ao Luiz Adelmo que me sucederá aqui na coluna.

Aqui na Gazeta de Sergipe encontrei um clima de companheirismo e amizade que não se pode aquilatar. As “broncas” do Sr. Orlando, diretor, gerente e companheiro de redação. As críticas charlemagnescas (longas, chatas e mortíferas) do Ivan, Secretário de Redação, quando se perdia um furo... O José Carlos Monteiro sempre irônico e impressionado com Kafka... Anselmo, que aprende na melhor escola – a da prática – como se faz jornalismo... O Novais, sempre solene com seus cabelos grisalhos e óculos escuros...  José Augusto, o homem das fotografias que nunca está onde nós estamos... Leônidas, o quebra-galhos oficial, o homem do Caixa, salvação dos vales... Chico Rosa, que só vive gritando, aparece correndo e some voando... O Carlos Alberto, fazendo crítica literária, leitor apaixonado de Camus... O J. Alberto na revisão, sofrendo horrores quando sai um pastel ou um gato... Eraldo Toledo, Hércules Batalha, os assessores oficiais da colunista social... Ari Figueiredo e suas elucubrações filosóficas... Sr. Zózimo e suas crônicas de um humor tranquilo... A todos vocês, muito obrigado.

Quero agradecer ainda ao Dr. Marques Guimarães que sempre tinha uma notícia para nós em primeira mão; ao Luiz Daniel Baronto, sempre gentil e gentleman; a Maria Luiz Vieira Cruz, Miss Sergipe 1965, cronista da Rádio Cultura, que sempre intercambiava notícias comigo; a Tereza Neumann, cronista do Diário de Aracaju e de A Cruzada por sua gentileza.

Eis uma lista de agradecimentos que não para... Como não agradecer às autoridades constituídas do Estado e do Município que sempre prestigiaram esta coluna? A Maria Auxiliadora Teixeira, uma jovemzinha que parece um elfo e tem alma de Titan, fazendo tudo para dar uma escola de arte a Sergipe? A Diretoria da Sociedade de Cultura Artística? Ao Rotary, ao Lions, ao Sesi, Sesc, Senac, Secretaria da Educação, Faculdades, a todos muito obrigada.

Quando resolvi fazer crônica social não quis assinar com meu nome por natural acanhamento. Então peguei o sobrenome completo de vovô e o utilizei: Rodrigues Correia de Souza (R. C. de Souza). Achava divertido quando recebia uma carta endereçada assim: Meu caro Souza... Tinha vontade de responder: não é meu, é minha. Não é caro, é cara. Tire o Souza... Hoje ao me despedir de vocês não direi mais au revoir; direi adieu. E, não mais assinarei R. C. de Souza, porém o meu nome completo, o nome da amiga, que é de vocês.

Zelita Rodrigues Correia”.

 

 

*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.

 

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