Jorge
Carvalho do Nascimento*
Segundo o
historiador Sebrão Sobrinho, em 1590, depois de conquistar o território de
Sergipe, Cristóvão de Barros entregou metade das suas terras, desde Aracaju até
as margens do rio São Francisco ao seu filho Antônio Cardoso de Barros (Laudas
da História do Aracaju, 1955, 20).
Considerando
exagerada a extensão territorial, a Coroa teria reduzido o domínio deste último
à metade que corresponderia a faixa compreendida entre os rios São Francisco e
Japaratuba. Assim, as terras situadas entre Aracaju e a margem direta do rio
Japaratuba ficaram devolutas à espera de sesmeiros que as requeressem.
A primeira
sesmaria conhecida é a de Pero Gonçalves, com l.000 braças de comprimento por
700 de largura, no cabo do rio Cotinguiba. Pedro Homem da Costa recebeu três
léguas de comprimento por uma de largura, entre o rio Cotinguiba e o Poxim.
Em 1736 essas
terras foram transferidas para Manuel Martins Chaves, pai de Chica Chaves,
proprietária do Engenho Aracaju da Cotinguiba, o Engenho Velho que
posteriormente seria transferido ao padre José Bernardino da Silva Botelho e ao
padre Antonio Chaves (SEBRÃO SOBRINHO, 1955, 67).
O Engenho Velho
pertenceu depois a professora Mariana Braga, que manteve uma escola nas proximidades
da atual ladeira do bairro Santo Antônio.
A criação do
encapelado de Santo Antônio do Aracaju data de outubro de 1778, quando o padre
Luís de Brito Soares recebeu a sua administração. Ali se estabeleceu o povoado
de Santo Antônio. O povoado é algo distinto da cidade que Inácio Barbosa
fundaria em 1855. Só posteriormente foi incorporado à malha urbana da nova
capital.
Contudo, é pouco
crível a tese sustentada por boa parte da historiografia sergipana, que
considera o espaço no qual a cidade de Aracaju foi erguida uma praia inóspita,
esquecida. A nova cidade foi construída a partir do sítio Olaria. Eram duas
Olarias: a Olaria do Aracaju e a Olaria das Almas.
A primeira, a
Olaria do Aracaju ou Porto dos Ferreiros, tinha sua sede na área central da
cidade erguida por Inácio Barbosa, nas proximidades da atual rua Estância. A
segunda, nas margens do rio do Sal. Uma terceira, a Olaria de Cima, que
existira no início do século XIX e pertencera a Cristóvão de Mendonça,
descendente dos Furtado de Mendonça, foi extinta em 1855.
Em toda a região
que circundava a Olaria do Aracaju existiam engenhos, sítios, lavouras,
criatórios, salinas, casas de telha, casa de palha e escolas. Dentre os
principais sítios e núcleos de moradores vale citar Gitimana, Saco, Porto,
Pedras, Olaria das Almas, Pau Grande, Bugiu, Melo, Manteiga, Vilanova, Taiçoca
de Fora, Miramar, Boca do Rio, Barreta, Borburema, Aroeiras, Chica Chaves,
Tramandaí, Lusia, Guageru, Mane Preto.
Nessas terras se
produzia mandioca, cana, arroz, milho, feijão, sal e coco. Existiam olarias,
fábricas de cal e oficinas de ferreiros. Em 1855, mesmo antes da mudança da
capital, em Aracaju já funcionava uma agência dos correios (SEBRÃO SOBRINHO,
1955, 85).
Na região viviam
importantes personalidades da vida política e econômica de Sergipe, como as
famílias Furtado de Mendonça, Rollemberg e Chaves (SEBRÃO SOBRINHO, 1955, 69).
No século XIX, era significativo o número de proprietários ricos que viviam na
região da Olaria do Aracaju, como André Cardoso Negrão, um agricultor negro,
nascido em 1784, casado com Maria Francisca, que morreu em julho de 1821.
Outra
personalidade importante na vida da Província era o pai putativo do comendador
Antonio José da Silva Travassos e do padre Francisco José da Silva Travassos. Ele
foi casado com Hipólita da Conceição, de quem ficou viúvo, e, ao morrer, em
maio de 1832, deixou a viúva Antonia Maria da Porciúncula (SEBRÃO SOBRINHO,
1955, 70).
A partir de 1850, depois da
vigência da lei que transformou a terra em objeto de comércio, os sesmeiros
começaram a regularizar a situação dos terrenos que estavam sob seu domínio. Do
mesmo modo, cresceram os pedidos de aforamento das terras localizadas nas áreas
de praia.
No caso da região da Olaria
de Aracaju, o ano de 1854 foi muito grande a movimentação. Em junho, duas
pessoas requereram aforamentos ao presidente Inácio Barbosa: Manuel Fernandes
da Silveira e Dionizio José Rodrigues. Em julho, foram oito os requerentes:
Guilherme Pereira da Costa, Isabel Rosa de Macedo, Rufina Francisca de Araujo,
Antonio Pedro Machado de Araújo, Cláudio José de Mendonça, Clemente Francisco
do Vale, Tomás Martins Cordeiro e Luis Francisco das Chagas, o Luizinho, o
maior proprietário de terras na região da Olaria do Aracaju em 1855.
Em setembro, o capitão dos
portos, José Moreira Guerra, requereu o aforamento de 50 braças de terra na
praia de Aracaju, enquanto em outubro idêntico benefício foi requerido por Luís
Francisco de Melo Cavalcante (SEBRÃO SOBRINHO, 1955, 84).
A região do atual bairro
Grageru era o sítio chamado Padre Soares, que havia pertencido a Luís Francisco
das Chagas, o Luizinho, o grande proprietário de terras, que controlava quase
toda a zona sul da nova capital. Ao norte este controle pertencia a João Cabeça
Mole. Os dois juntos eram proprietários da maior parte das terras da cidade.
A população da nova capital
cresceu rapidamente. Entre os anos de 1857 e 1859, já a partir do segundo ano
de instalação da cidade fundada por Inácio Barbosa, Sergipe viveu uma grande
crise de abastecimento que resultou em muitas mortes e no registro de saques a
armazéns e outras casas comerciais. Em Aracaju, o custo de vida ficou bastante
elevado.
“Cidade-capital, recém
fundada, aí começavam a concentrar-se funcionários e trabalhadores de
construção que nenhuma relação tinham com a produção de bens alimentares. Eram
consumidores pura e simples. Nela, os gêneros alimentícios se faziam raros
também pelas dificuldades de comunicação com os centros produtores.
Enquanto nos mercados de
Maroim e Laranjeiras se comprava um arrátel de carne por $160 réis, em Aracaju
somente se conseguia peso igual por $200, $240 e $280 réis. A terça de farinha
de mandioca nas primeiras cidades custava 5$000 a 6$000, ao passo que em
Aracaju o preço chegou ao incrível valor de 24$000 e 28$000 réis. Somente por
8$000 ou 10$000 réis se conseguia uma libra de açúcar refinado, enquanto em
Maroim e em Laranjeiras, o produto estava por 5$000 ou 6$000” (Maria da Glória
Santana de ALMEIDA, 1978, 25).
A construção da nova capital
de Sergipe causou forte impacto na vida de toda a Província, inclusive no que
diz respeito a produção de alimentos. A partir de 1855, de modo crescente,
muitos trabalhadores rurais se afastaram dos seus serviços no campo,
dedicando-se a atividade de trabalhador urbano da construção civil,
empenhando-se nas obras dos prédios públicos e nas residências dos funcionários
que migraram para Aracaju.
A principal atração era o
salário que se oferecia a esses operários, à época considerado exorbitante em
face do que eles ganhavam como trabalhadores rurais. Somente no ano de 1855,
quando as obras foram iniciadas, Aracaju recebeu mais de 200 homens,
procedentes dos municípios de Itabaianinha, Campos, Lagarto, Simão Dias e
Itabaiana (Maria da Glória Santana de ALMEIDA, 1978, 33).
*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
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