Jorge
Carvalho do Nascimento*
Repercutiu
muito a angústia depressiva da ginasta norte-americana Simone Biles, detentora
de 31 medalhas de competições olímpicas e de campeonatos mundiais. Em meio a
Olimpíada que se disputa atualmente no Japão, ela se submeteu a uma avaliação
médica e optou por se ausentar das disputas e cuidar da sua saúde mental.
Os
problemas de saúde mental entre atletas de alto rendimento são mais comuns do
que se possa supor. O físico escultural, a fama, o estrelato, os recordes e as
vantagens econômicas oferecidas pelos patrocinadores não são nenhuma garantia do
gozo de uma boa saúde mental.
Há
uma angústia latente e permanente para todos eles, dada pelo fato de possuírem carreiras
que garantem ascensão rápida e sucesso retumbante a pessoas que em boa parte
dos casos são portadoras de histórias de vida com infância e adolescência
marcadas por situações de pobreza extrema e famílias nem sempre ajustadas no
sentido de garantir afeto e aconchego psicológico.
Essas
vidas são marcadas pelo temor de que as carreiras curtas da atividade esportiva,
os remeta de volta a situações de pobreza extrema e desconforto material. Mas,
estes são apenas fatores que se aliam ao temor de perda da fama e do
reconhecimento púbico próprios a tal atividade.
Em
boa parte dos casos, esse tipo de atleta é apartado da família ainda muito
jovem e aprende a conviver sob estresse e horas seguidas de treinamento
extenuante. Tal vida os distancia da rotina das pessoas comuns e os faz
obcecados pela busca infindável do limite físico e das aptidões e habilidades
técnicas.
Meninos
e meninas que não vivem a plenitude da sua vida de criança, que se alienam da
infância em nome do bom desempenho na modalidade esportiva à qual estão
dedicados. Que desde cedo são postos diante da obrigação de vencer as
competições e superar suas próprias marcas, custe o que custar.
Perder
ou não ser o primeiro deixa de ser encarado como um fato humano normal e se
transforma num ultraje a ser evitado, numa espécie de desonra, negando na
prática a conhecida máximo do Barão Pierre de Coubertin, segundo a qual o
importante seria competir e não vencer.
Dois,
três ou mais resultados ruins consecutivos podem destruir uma vida inteira de
dedicação, posto que os patrocinadores optam por migrar suas generosas verbas
para outros atletas mais promissores. A dor se transfere do corpo para a consciência
atormentada do desportista que se vê, então, como um fracassado, pouco importa
qual seja até então o seu vitorioso histórico.
Consequência
imediata: depressão, ansiedade, comprometimento da autoestima, pânico e outras
perturbações mentais com forte repercussão no desempenho físico que
retroalimenta todo o processo e produz novos resultados que são percebidos pelo
próprio atleta e pelos seus circunstantes como uma sucessão de fracassos que
remetem ao final da carreira.
A
imagem do atleta deixa de ser a do herói capaz de vender todas as
quinquilharias que o patrocinador coloca no mercado. Por isto, na maioria dos
casos, os atletas e a estrutura de gerenciamento de carreira que os cercam
tentam a todo custo esconder de todos os problemas de saúde que atingem cada um
deles.
Simone
Biles é nesse sentido uma mulher extremamente corajosa que merece o aplauso e o
reconhecimento de todos. Outros astros de alto rendimento esportivo padeceram
já de situações semelhantes. Alguns sucumbiram, outros refizeram suas
carreiras. A lista de nomes é infindável.
Ross
Willians, conhecido jogador da modalidade de futebol norte-americano padeceu com
o transtorno de personalidade Boderline. Outros casos conhecidos de depressão e
ansiedade entre atletas de alto rendimento são os do nadador Michael Phelps; da
tenista Jennifer Capriati, ex-número um do mundo; da judoca brasileira, com
medalha de ouro, Rafaela Silva; o celebrado ginasta brasileiro Diego Hypolito;
e, o jogador de basquetebol da NBA, Lucas Bebe.
O
futebol profissional, esporte que mais emociona os brasileiros e os torcedores
de várias outras nações, é rico em exemplos. Adriano, apelidado O Imperador, atleta
com carreira vitoriosa na seleção brasileira de futebol, no futebol
internacional e no Clube de Regatas Flamengo, abandonou a profissão aos 34 anos,
depois de uma depressão provocado pela morte do seu pai e pelo rompimento do
tendão de Aquiles. Não nega que mesmo com toda a fama e todo o dinheiro
terminou entregue ao alcoolismo, do qual agora está curado.
Os
brasileiros nunca esqueceram a partida final da Copa do Mundo de Futebol, em 12
de julho de 1998, o jogo Brasil X França, no Estádio de Saint-Denis. O Brasil
perdeu o jogo por 3 X 0 e a derrota foi atribuída ao jogador Ronaldo Fenômeno,
à época com 21 anos de idade.
Muitas
histórias desencontradas cercam aquela partida e a perda do título de Campeão
Mundial pelo Brasil, até hoje não esclarecida. Apesar de o Brasil perder o
título, Ronaldo terminou aquela Copa do Mundo recebendo o troféu Bola de Ouro, oferecido
ao melhor jogador da competição.
A
decisão tomada esta semana por Simone Biles foi corajosa e digna, demonstrando
a responsabilidade de uma atleta madura, premiada, responsável e consciente do
que representa atualmente na cena das competições esportivas internacionais. Reconhecer
os próprios limites é um ato dado somente aos fortes. A ela, os meus aplausos e o
meu respeito.
*Jornalista, doutor
em Educação, membro da Academia Sergipana der Letras e presidente da Academia
Sergipana de Educação.
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