Jorge
Carvalho do Nascimento*
A
cada quatro anos, sempre em um ano par, a reflexão a respeito de questões
postas pelos jogos olímpicos toma conta dos meus pensamentos e faz com que eu
me assuste diante da minha ignorância, que neste caso cabe bem chamar de
olímpica, acerca de questões esportivas.
A
situação está mais aguda neste 2021, quando estamos celebrando a realização de
jogos olímpicos em ano ímpar. Este é o primeiro estranhamento. Afinal, Olimpíadas
são realizadas a cada quatro anos. A última edição foi em 2016. A pandemia
Covid-19 transformou quatro anos em cinco ou cinco anos em quatro? Outra dúvida
que eu não sei responder.
Para
debochar ainda mais de mortais comuns e ignorantes quanto aos esportes como eu,
os Deuses do Olimpo (no caso, os Deuses do Comitê Olímpico Internacional – COI)
deliberaram ser a cidade de Tóquio, no Japão, o espaço geográfico adequado para
isto. Pela primeira vez tive o desejo de ser correta a tese dos terraplanistas.
Me convenci definitivamente que eu não estou equivocado. Errados estão os
terraplanistas.
Desde
o dia 20 de julho fico acordado diariamente até as três da madrugada e coloco o
despertador para me acordar as seis da manhã, a fim de acompanhar as
competições dos 40 esportes que adornam os pescoços dos atletas vencedores com
medalhas de ouro, prata e bronze. Cada premiado recebe também um ramo com três
flores e o mascote símbolo dos jogos.
As
competições no Japão começam por volta das 10 da manhã (hora de Tóquio), quando
no Brasil ainda não é o dia da prova. Assistimos aos jogos um dia antes do dia
em que eles efetivamente acontecem. Quando no Japão são 10 da manhã do dia 21, aqui
ainda são 22 horas do dia 20.
Os
jogos no Japão terminam por volta das 10 da noite. Quando o sol para ele já se pôs,
nós ainda não chegamos ao meio-dia, ainda não almoçamos e alguns mal acabaram
de tomar o café da manhã. O sol continua a subir e chegará à posição de sol a
pino somente duas horas depois.
Quando
eu era criança e comecei a aprender a respeito da redondeza da terra, um
questionamento sempre me chegava à cabeça: se eu fizesse um furo em direção ao
centro terra, partindo de Aracaju, eu sairia no Japão ou na China? Estava
informado que ambos os países estavam do outro lado da terra.
Um
dia, o meu espírito de menino curioso e traquinas, movido pelo empirismo,
conceito que eu sequer conhecia, fez com que eu esquentasse um espeto fino na
chama do fogão, pegasse o único globo terrestre que havia na casa dos meus pais
e furasse o plástico, atravessando o planeta rapidamente, de um lado a outro.
A
experiência chocou a minha cabeça de menino tolo. Primeiro porque sempre que me
diziam estar o Japão do outro lado do mundo, a minha imaginação de menino
curioso questionava: se eles ficam do outro lado do planeta e eu estou aqui
sobre a terra, eles vivem de cabeça para baixo? Por que não caem? Eu ainda não
compreendia a tal força de gravidade.
Fazer
a experiência me levou a uma constatação que até aquele momento eu não havia
considerado. A cidade de Aracaju está no hemisfério sul. Logo, quem está de
cabeça para baixo sou eu e não os japoneses, que vivem no hemisfério norte.
Descobrir isto me horrorizou com o risco de desabar da superfície do planeta a
qualquer momento em direção ao desconhecido azul infinito do espaço sideral.
Ao
concluir a experiência de furar o planeta, uma nova frustração. Não saí no Japão,
como eu pretendia. É verdade que fiquei bem próximo, mas o furo que eu fiz aflorou
no território da Coreia do Norte. A Península Coreana não mais pertencia aos
japoneses, como fora no passado. Kim Il-Sung, desde 1948, com o fim da Segunda
Guerra Mundial, expulsara os japoneses, fundou o país e passou a governar aquele
Estado, que descobri estar em posição diametralmente oposta à cidade de
Aracaju.
Agora,
as minhas noites insones em face dos jogos olímpicos estão aí para me mostrar
como seria bom se estivessem corretos os teóricos do terraplanismo. Os
japoneses teriam necessidade de ser muito debochados para marcar as atividades
olímpicas em plena escuridão das madrugadas, posto que sendo tudo plano o sol
iluminaria a todos nós ao mesmo tempo. A não ser que faltasse caráter ao astro
rei ou fosse este excessivamente gozador.
Até
o dia oito de agosto estarei condenado a atravessar de olhos abertos as minhas
madrugadas, a fim de não perder as exibições dos atletas dos 40 esportes que
participam dos jogos. Mesmo sabendo que não entendo absolutamente nada de mais
de metade de tais esportes e que não chegam a 10 o número daqueles em relação
aos quais eu domino os rudimentos da sua lógica. Mas, isto é outra história.
Depois eu conto.
*Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
sempre interessante!!!!!
ResponderExcluirExcelente comentário. Qdo li me identifiquei como mais a respeito do medo de cair se ocorresse um giro da terra. Qdo menino eu também pensava que se fizéssemos um furo aqui cairiam no Japão. Tento acompanhar os jogos também. Muito bom.
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