Jorge
Carvalho do Nascimento*
Em
dezembro de 2021 estive no edifício do Jardim de Infância José Garcez Vieira,
no bairro Siqueira Campos, e participei da bonita festa que foi a noite de
autógrafos organizada pela pesquisadora Tereza Cristina Cerqueira da Graça,
quando do lançamento do seu livro MALINOS, ZUADENTOS, ANDEJOS E SIBITES: O
ARIBÉ NOS ANOS 70 E 80.
Sou
suspeito por princípio. Gosto de tudo que Cristina escreve. Texto escorreito,
direto, linguagem descomplicada e objetos de estudo sempre muito originais
caracterizam o trabalho da professora desde que ela publicou o livro que eu
mais gosto, o seu ensaio antropológico no campo da História da Educação, PÉS DE
ANJO E LETREIROS DE NEON.
MALINOS,
ZUADENTOS, ANDEJOS E SIBITES, o seu último livro, é um tributo à juventude que
viveu nas décadas de 70 e 80 do século XX no bairro Siqueira Campos, o Aribé.
Sem o capital econômico e de status social dos jovens que viveram no mesmo período
em bairros mais elitizados de Aracaju, as meninas e os meninos do Siqueira
Campos acumularam capital cultural suficiente para participar do processo de
ressignificação da história política e social da cidade que sedia o governo do
Estado de Sergipe.
O
livro que Cristina colocou em circulação no final do ano de 2021, publicado
pela editora Códice, é uma bem cuidada brochura de 503 páginas no formato de 16
X 22,5 centímetros, tudo impresso e encadernado na gráfica J. Andrade. A capa,
o projeto gráfico e a diagramação foram criados por Jeane de Santana.
Cristina
é graduada em Pedagogia, mestre em Educação pela Universidade Federal de
Sergipe e doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul. Aposentada da carreira docente nas redes municipal de Aracaju e
estadual de Sergipe, Tereza Cristina foi secretária da Educação do município de
Aracaju e professora da Universidade Tiradentes.
Para
prefaciar o trabalho, sua autora convidou o professor Lourival Santana Santos,
já aposentado da sua produtiva carreira de docente e pesquisador pelo Departamento
de História da UFS. Também um dos meninos do Aribé, Lourival afirma que o livro
rememora objetos, brincadeiras, lugares, cenários, pessoas e expressões.
De
fato, ao embarcar na viagem que Cristina propõe ao seu leitor, aos poucos se
descortinam figuras marcantes na história daquele aglomerado urbano da zona
oeste de Aracaju. Figuras como os cantores José Augusto Sergipano, Lucinha
Fontes, Brasinha e Tut Fred.
Compositores
como Agnaldo Batista, do Bar dos Estudantes, e grupos musicais como o Repente,
liderado por Carvalhinho. A narrativa não esquece a rapaziada do Black Samba,
Sergival, Pantera, Rivando Góis e Sérgio Lucas. Tampouco deixa à margem figuras
como a carnavalesca Isabel Nunes, o festeiro Hilton Lopes e o agitador cultural
Severo D’Acelino, ator, teatrólogo e importante líder do movimento negro.
No
cenário construído por Cristina, não poderiam faltar os cinemas do bairro
Siqueira Campos e as pessoas que por eles passavam. Aos poucos vão se abrindo
as cortinas do cine Bonfim, do cinema Santa Cruz e do Plaza. Também há
registros para outros espaços de diversão, como hi-fis, boates e bares.
Numa
área como a do Aribé não poderiam faltar os organizadores que articulavam
blocos e tomavam outras iniciativas que levavam os moradores do bairro Siqueira
Campos a participar dos carnavais de Aracaju.
Os
detentores do poder econômico, importantes comerciantes e prestadores de
serviço daquela região também são apresentados por Tereza Cristina. Proprietários
de terras como Mariano Salmeron, fabricantes de urnas funerárias como Lió, a
professora Dona Eulina, Zé da Farmácia e o alfaiate Florival Freitas.
Cristina
não esqueceu de alguns dos seus amigos que se destacaram como intelectuais
daquele bairro e que morreram precocemente, a exemplo do irrequieto professor
Enaldo Silva e do também professor Murilo Smith, o Murilão. Contudo, não são
apenas as personalidades do Siqueira Campos que emergem das páginas do livro de
Tereza Cristina.
Nomes
relevantes da vida social em Sergipe que por alguma razão estabeleceram ligações
com o bairro também são lembrados. Na segunda metade da década de 70 do século
XX, a festejada colunista social Lânia Duarte costumava frequentar a Cantina do
Bizu, à rua Mariano Salmeron, propriedade do jornalista e músico Hiton Lopes,
de quem Lânia, quando adolescente, recebera aulas de bateria.
De
acordo com Cristina, a Cantina do Bizu “Era um ambiente muito legal, com muita
gente da alta sociedade, muitos jornalistas, radialistas, artistas, políticos”
(p. 282). O celebrado colunista social João de Barros organizou ali o VIII
Baile dos Artistas, realizado em 1980.
A
frequência de jornalistas e colunistas sociais faziam da Cantina do Bizu, mesmo
localizada no bairro Siqueira Campos, um point procurado por pessoas
acostumadas a frequentar os espaços da elite aracajuana.
Apesar
de suspeito, com isenção recomendo a leitura.
*Jornalista, doutor em Educação, professor aposentado do Departamento de História, do Mestrado e do Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
Comentários
Postar um comentário