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CÉU DE BRIGADEIRO


  

 

Jorge Carvalho do Nascimento*

 

 

Marcos Antônio de Melo foi prodígio desde sempre. Aos 25 anos de idade, em 1970 era secretário de Estado da Administração em Sergipe. Dois anos antes, em 1968, havia colado grau em Ciências Econômicas pela Universidade Federal sergipana. O economista propriaense havia iniciado o ensino médio em Maceió, no prestigiado Colégio Batista Alagoano, quando era corrente o ano de 1961, e concluiu tal ciclo de estudos em 1963, no Colégio Estadual de Sergipe, o velho Atheneu.

Depois que ascendeu ao primeiro time da administração pública de Sergipe, Marcos não parou mais. Nem como gestor e muito menos como intelectual insaciável na busca por novos conhecimentos. Já muito experiente na gestão, obteve o título de mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas, do Rio de Janeiro, defendendo sua dissertação em 1982.

Marcos desejou ampliar os seus saberes para além do campo da Economia. Prestou concurso vestibular, fez matrícula, frequentou o curso, estudou e se fez bacharel em Direito pelo Centro Universitário de Brasília – CEUB, no ano de 1982. Em seguida se submeteu aos exames da OAB e obteve o título de advogado.

Tendo trabalhado como repórter do jornal Gazeta de Sergipe a partir de 1974, reiteradas vezes entrevistei o jovem economista Marcos Melo acerca dos problemas de desenvolvimento do Estado de Sergipe. Nos aproximamos mais e dele me fiz amigo a partir da década de 80 do século XX.

Jorge Araújo, chefe de gabinete de Marcos Melo na Secretaria da Indústria e Comércio a partir de 1979, amigo e padrinho da minha filha mais nova, fez a nossa aproximação. Foi fascinante descobrir o boêmio saxofonista por trás do requisitado gestor público estadual que foi titular em quatro diferentes secretarias de Estado, dirigente da Confederação Nacional da Indústria, do SESI, professor da Universidade Federal de Sergipe e membro do Conselho Federal de Economia.

Membro da Academia Sergipana de Letras, Marcos Melo é autor dos livros Propriamente Falando, O Conde de San Vincent: Por Uma Nova História de Sergipe, Falando Propriamente e, também Propriá e Sua Academia de Letras, Ciências, Artes e Desportos. A condição de bom cronista marca o autor dessa boa literatura.

Na próxima quarta-feira, 24 de maio, Marcos fará chegar um novo livro às mãos dos leitores que se encantam com a sua crônica de tipos bem construídos, a partir das suas experiências de vida mescladas ao mundo ficcional nascido da sua fértil imaginação. Tipos populares da sua Propriá, às margens do rio São Francisco, da Maceió onde foi estudante, de Aracaju, Rio de Janeiro, Brasília, cidades nas quais viveu, e outros lugares onde passou como turista. Todos desfilam no novo livro.

O Último Voo e Outras Histórias é uma coleção de 85 crônicas dessas que os escritores legam na maturidade, quando já experimentaram todas as coisas que a vida proporciona e estão naquele momento em que já lhes é permitido dizer o indizível, posto saberem que já não criarão tanto problema quando revelarem dadas inconfidências.

O estilo elegante de narrar de Marcos Melo aparece agora com maior refinamento, abonado por bons leitores como o empresário e ex-prefeito de Aracaju, João Augusto Gama, que assina uma das abas (que eu prefiro chamar de orelhas mesmo) do livro, e o advogado Eduardo Ribeiro, convidado pelo autor para assinar o prefácio.

A edição, como sempre cuidadosa da Criação Editora, tem como co-editor a Editora do Conde num livro de 274 páginas impressas pela gráfica J. Andrade em formato 15,5 X 21 centímetros sobre papel Pólen 90g/m2, tipologia Andada e capa em cartão Supremo de 250g/m2.

A crônica que serve de título ao livro trata das frustrações amorosas dos homens da terceira idade quando estes se envolvem com jovens argutas e imaginosas, tal como se costumava dizer no passado das amantes argentinas. Mas, não apenas. Também são apresentados tipos que a memória do autor recolheu em Propriá, como José Rodrigues Mariú e o seu originalíssimo livro Mar Luminoso e Denoksuá.

O escritor Marcos Melo não esquece de homenagear figuras que admirou em vida, como o cantor e compositor que fundou a Bossa Nova, João Gilberto, contando as histórias dos amigos do mestre da música popular brasileira quando este era estudante em Aracaju, na metade do século XX.

Dentre os amigos ao qual Marcos rendeu homenagens, está o jornalista, professor e historiador Luiz Antônio Barreto, que desembarcou precocemente desta vida. A mesma coisa fez o autor com poetas que admira, a exemplo de Vinicius de Moraes e de Edgar Allan Poe; sociólogos e filósofos como José Amado Nascimento e Alceu de Amoroso Lima.

Em várias crônicas, Marcos dialoga com o seu amigo João Augusto Gama, parceiro de habituais tertúlias literárias, com quem se reúne periodicamente para sorver generosas taças de vinho e debates sobre escritores, poetas e tudo o mais que envolve o universo dos livros e da vida literária.

O último texto do livro de Marcos homenageia o engenheiro aracajuano Luiz Eduardo Magalhães, à memória de quem o livro é dedicado, importante intelectual que morreu no dia 9 de outubro de 2022, aos 83 anos de idade. Luiz Eduardo foi um arguto observador da vida brasileira que gostava de se debruçar em discussões sobre política e economia.

Tem razão o advogado Eduardo Ribeiro, prefaciador do trabalho, ao afirmar, citando Rubem Braga, que Marcos Melo sabe “usar em doses certas o lirismo e o delírio, ora um, ora outro, ora ambos em conjunto, para desenhar as narrativas que o seu sofisticado intelecto tempera” (p. 7).

Marcos ainda tem muito a escrever e nos contar. Estou certo de não ser este o seu último vôo literário, mas apenas mais uma contribuição que decolou na hora certa e diferente da sua crônica chega ao aeroporto de destino no momento aprazado para deleite dos leitores. É mais um voo em céu de brigadeiro. Outros virão.

 

 

*Jornalista, doutor em Educação, professor aposentado do Departamento de História, do Mestrado em História, do Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. Membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.

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