Jorge
Carvalho do Nascimento*
Em
1978 eu trabalhava na Assessoria para Assuntos Culturais da Secretaria da
Educação e Cultura do Estado de Sergipe. Compunha a equipe de trabalho
coordenada por Luiz Antônio Barreto e na condição de representante daquele
grupo participei do II Encontro Nacional do Ensino de Cinema nas Escolas de 1º
e 2º Graus.
Coordenado
por Djaldino Mota Moreno, então presidente do Clube de Cinema de Sergipe, o
evento reuniu intelectuais ligados ao esforço que buscava os caminhos capazes
de perenizar o ensino de cinema nas escolas de 1º e 2º graus. Integrei o grupo
que redigiu o documento final do Encontro.
Participando
ativamente de todos os debates e integrando comigo e com outros participantes a
equipe que redigiu o documento, tive a oportunidade de conhecer um professor de
Educação Artística do Atheneu Sergipense, especializado em cinema, que me
chamou a atenção por vários fatores.
O
brilho da inteligência daquele professor impactava a todos. A tenacidade usada
por ele para defender as suas teses, os seus pontos de vista, o transformava em
um debatedor duro que dificilmente recuava em suas posições e que não gostava
de conciliar com outros pontos de vista.
O
jovem professor Justino Alves de Lima chamou a atenção de todos os
participantes e foi uma das figuras que mais influenciou as decisões tomadas no
Encontro, pela sua incontestável capacidade de argumentar bem e por defender as
teses mais avançadas dentre as muitas discussões que ali se realizou.
Estabelecemos
a partir de então uma relação de amizade marcada por encontros e desencontros,
como é natural. Em vários momentos nossas posições convergiram e em outros se
distanciaram. Contudo, nenhum tipo de divergência impediu que eu deixasse de
admirar Justino e entender que ali estava um cidadão que faz a defesa da
democracia e dos interesses populares como princípios sob os quais pauta a sua
vida.
O
tempo passou e muitos anos depois reencontrei Justino como colega de trabalho
na Universidade Federal de Sergipe. Bibliotecário, Justino teve uma atuação
muito importante na organização da Biblioteca Central e de todo o sistema de
bibliotecas setoriais da UFS.
Assim
que completou o tempo de serviço necessário a sua aposentação, no século XXI,
Justino requereu o benefício da aposentadoria a que faz jus e se recolheu à
vida privada, sem contudo esquecer suas responsabilidades de cidadão e passando
a atuar por outros caminhos ao seu alcance.
Esta
semana fui presenteado por uma amiga comum (minha e de Justino), a editora de
livros Adilma Menezes, fundadora e dirigente da Criação Editora, importante
empresa de editoração de livros, responsável pela publicação dos meus trabalhos
e de tantos outros que se dedicam ao ofício de escrever livros.
Ao
chegar em casa abri o envelope que recebi de Adilma. Nele, o livro CATEDRAIS DO
SILÊNCIO. Autor: Justino Alves de Lima. O mesmo Justino do qual eu não tinha
notícias desde que este se aposentara do seu trabalho na Biblioteca Central da
UFS. Uma edição bonita, muito bem cuidada, como todas da Criação Editora.
Cheirei,
admirei a bonita capa, gostei da tinta de impressão bem aplicada sobre o papel
Pólen, o que proporciona um bom conforto aos olhos dos leitores que se lançam a
decodificação do texto contido em tal suporte. Aplaudi o fato de Justino haver
dedicado o livro a um outro amigo comum que, lamentavelmente, já foi colhido
pela inexorabilidade da morte – Luiz Fernando Ribeiro Soutello.
Extremamente
esclarecedor o Prefácio do livro, assinado pelo bibliotecário Fábio Faria.
Situa Justino e sua rica personalidade, mostrando ao leitor a grandeza do autor
do livro. Chama a atenção para os
contextos histórico, ambiental e político no qual Justino coloca as bibliotecas
que analisa e o discurso que faz a respeito dos entraves enfrentados pela
Biblioteconomia em Sergipe e no Brasil.
Quando
me lancei à leitura das reflexões feitas por Justino me deparei com um autor de
texto fluido e envolvente, desses que a gente começa a ler e não consegue mais
parar. Foi a minha principal ocupação nos últimos dois dias. Não consegui
desgrudar os olhos do papel até chegar à página 142, na qual Justino coloca o
ponto final.
O
autor foi buscar no clássico romance de Umberto Eco, O Nome da Rosa, a
inspiração para estabelecer a sua metáfora condutora da construção discursiva,
demonstrando fartamente o silêncio dominante nas bibliotecas, templos ornados
com acervos bibliográficos nem sempre lidos.
Chama
a atenção para a importância que tem, no Estado de Sergipe, a corporação dos
bibliotecários e suas organizações associativas, nem sempre eficazes. Demonstra
o papel exercido também em Sergipe por bibliotecárias e bibliotecários baianos
e pernambucos, os dois centros de formação mais próximos num momento em que as
instituições de ensino superior sergipanas ainda não ofereciam o curso de
Biblioteconomia.
Prossegue
analisando problemas como o da formação de acervos e as dificuldades de
manutenção das bibliotecas públicas estaduais e municipais sergipanas
denunciando mazelas provocadas por gestões amadoras e lideranças políticas que
deixam de lado os profissionais da área.
Enfim,
o silêncio das catedrais de Justino é um volumoso grito de protesto que
incomoda todos os defensores da cidadania. Oxalá fira a surdez dos ouvidos de
líderes políticos que possuem em suas mãos o poder e a possibilidade de
modificar tal cenário. Recomendo a leitura.
*Jornalista, professor aposentado do Departamento de História, do Mestrado em História e do Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Federal de Sergipe. É membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação.
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